Esta dissertação se propõe a reunir alguns elementos conceituais que, oriundos das
reflexões da corrente estoica da Filosofia Antiga, possam em seu conjunto articular e fornecer
as bases de uma concepção peculiar da ideia de História, cuja inteligibilidade geral, ao exibir
os traços de um pensamento filosófico sui generis, contribui potencialmente para a
problematização de determinadas experiências e modos de entendimento amplamente
sedimentados no processo de formação da cultura ocidental. Na Modernidade, a História será
o alvo de uma renovada onda de atenção e entusiamo, na medida em que uma nova
experiência do tempo e da liberdade humana verá nela, simultaneamente, a suma do
fenômeno humano e a ciência que o explica, de maneira que a História passa então a
proporcionar ao homem moderno uma consciência objetiva a respeito de si mesmo e das suas
aquisições. No conjunto destas encontra-se a Filosofia, e não tardou para que uma íntima,
complexa e não menos problemática relação fosse estabelecida entre a História e a Filosofia,
onde a primeira, esclarecendo o movimento que confirmava o homem no seio da Razão,
recebia em troca da segunda a sua justificação enquanto o saber revelador de uma verdade
total e objetiva. Os termos dessa relação entre a Filosofia da História e a História da Filosofia
— e que foi concebida como uma verdade dinâmica vindo à luz na forma de um despertar
consciente — encontraram na filosofia sistemática de Hegel a sua síntese mais sólida, fazendo
assim da consciência o atributo mais notável da História. No entanto, a relação de
proximidade que a História mantém com a Filosofia pode ser encontrada muito antes daquela
articulada pela consciência moderna, encontrando as suas raízes em um tipo de experiência
diversa, e que foi responsável pelo surgimento do modo de pensar filosófico e histórico ainda
na Antiguidade. Buscamos, assim — com base na empiria da primeira tradição filosófica e
historiográfica do Ocidente —, investigar o sentido da ideia de experiência por elas
compartilhadas, e que manteve-se conservado na filosofia dos estoicos. Sendo determinada
pelo limite, pela finitude e pela morte, a experiência aqui em questão permite que coloquemos
sob suspeita o estatuto do saber e da verdade produzidos pela História, que, não estando mais
associada em sua totalidade à consciência, possibilita assim uma crítica do sentido de
objetividade com o qual a História, respaldada pela Filosofia, organizou os conteúdos do
pensamento e das práticas filosóficas a partir da Modernidade. Do ponto de vista da filosofia
estoica, essa alteração do critério da experiência para a definição do conhecimento histórico
torna-se crucial, visto que, no interior da “objetividade” da moderna História da Filosofia, o
estoicismo foi percebido segundo uma imagem distorcida, onde o sentido integral de suas
doutrinas — justamente por apresentar uma perspectiva diversa ao problema essencial da
Modernidade, isto é, a experiência da liberdade na contingência — foi e ainda mantém-se
como uma filosofia marginalizada, e por esse motivo pouco conhecida, na medida em que ela
se contrapõe fundamentalmente a uma visão hegemônica da Filosofia, disputando assim, no
âmbito da contingência da História, os significados da Razão.