Compreendendo a(s) infância(s) como uma construção social em um tempo-espaço e as crianças como sujeito de direitos que participam ativamente dessa construção social, ou seja, produzem culturas, acompanhamos o cotidiano de 4 crianças “calunga” (termo com raiz africana que nomeia quem nasce em São Vicente/SP) moradoras de um bairro periférico da cidade de São Vicente-SP e frequentadoras do “Camará”(uma Organização Não Governamental). Nosso objetivo foi de ampliar conhecimentos sobre as vidas dessas crianças de modo que esse estudo possa subsidiar às políticas públicas sociais, no tocante a construção de ações e projetos futuros em consonância com a realidade, linguagem e desejos desse público. Para isso realizou-se um estudo qualitativo com base teórica e metodológica na etnografia. As crianças acompanhadas foram duas meninas e dois meninos, de idade entre 9 e 12 anos. As crianças atuaram como coautores da presente pesquisa, ou seja, elas mesmas expressaram os sentidos de suas vidas sendo o pesquisador mediador da organização dessas expressões. Essas mesmas crianças permitiram o acesso e o convívio em suas casas, na circulação pelo bairro em aventuras brincantes, no estar em espaços institucionais da ONG, em conversas mais sérias sobre namoro, violência, cultura, etc. Todas essas vivências foram registradas em diário de campo e foram organizadas em categorias de análise, a saber: importância da rua para suas vidas; modos brincantes das crianças ocuparem o bairro e a cidade; suas relações com o tráfico e a polícia; sexualidade e diferenças entre os gêneros; a relação das crianças com a ONG que participavam; e, por fim, a arte, cultura e os bailes funk. Os principais resultados foram em relação aos modos inventivos e brincantes de circularem pelo bairro em que elas chamavam de “missões”. Nessas aventuras, elas reivindicavam uma cidade menos “adultocêntrica”, transgredindo e inventando suas próprias regras de uso ou prática dos espaços. A partir de sua organização coletiva e imaginação, que não era neutra a estereótipos e signos capitalísticos, produziam novos contornos e funcionalidades aos espaços, abrindo a possibilidade de resistência a situações de negligência do Estado, como a falta de espaços próprios para as crianças. O produto técnico dessa pesquisa foi um livro infantil em que conta uma “missão” de 4 crianças negras em um bairro periférico, sendo material acessível para crianças, adultos, educadores e demais interessados.