As leishmanioses são doenças infecciosas de caráter zoonótico, que têm como agentes
etiológicos parasitos do gênero Leishmania (Kinetoplastida: Trypanosomatidae) e como
vetores, desses agentes insetos da família Psychodidae. A Leishmaniose Visceral (LV),
conhecida também como Calazar, é a que apresenta maior letalidade, sobretudo entre
crianças, idosos e indivíduos imunocomprometidos. Nas Américas, o agente etiológico da
LV é Leishmania infantum (=L. chagasi) e o principal vetor deste parasito é a espécie
Lutzomyia longipalpis. Considerando a importância da LV e seu processo de expansão
geográfica, a compreensão das relações epidemiológicas que envolvem o estabelecimento do
ciclo é de fundamental importância para a proposição de medidas de prevenção, vigilância e
controle da doença. Diante do exposto, este trabalho teve como objetivo o levantamento da
fauna de flebotomíneos munícipio de Ribeirão Vermelho, Sul de Minas Gerais assim como
a investigação da ocorrência de casos de infecção natural em cães e a detecção de DNA de
Leishmania nos vetores. Foram conduzidas duas ações de educação em saúde nas quais foram
realizados testes sorológicos em cães, DPP-Biomanguinhos como teste de triagem, e ELISA
confirmatório, sendo estes preconizados pelo Ministério da Saúde. Foram testados 348
animais, sendo 186 (53,45%) fêmeas e 162 (46,55%) machos. Destes, 14 animais (4,02%)
apresentaram sorologia positiva nos em ambos os testes, e dois destes cães foram submetidos
à eutanásia, após autorização dos proprietários, com confirmação parasitológica e molecular
da infecção. Entre os outros cães, 4 foram eutanasiados, e o restante não foram entregues ao
serviço de saúde do município. Com relação à investigação entomológica, durante o período
de fevereiro de 2018 a maio de 2019 foram instaladas armadilhas do tipo HP em residências,
nas quais havia presença de cães positivos nas sorologias e ao redor dessas residências. Um
total de 443 espécimes de flebotomíneos foram capturados, sendo estes pertencentes a pelo
menos 13 espécies. As espécies mais abundantes foram, respectivamente, Lutzomyia
longipalpis (73,8%), Expapillata firmatoi (6,7%), Nyssomyia intermedia (5,19%) e
Evandromyia cortelezze (3,84%). A análise molecular permitiu identificar a presença de
DNA Leishmania em 21 das 157 amostradas testadas, sendo estas pertencentes aos seguintes
gêneros e/ou espécies Lu. longipalpis, Brumptomyia spp., Miggonei. migonei, Ex. firmatoi,
Ev. cortelezze e Pintomyia fischeri. Este foi o primeiro estudo que objetivou investigar a
situação da LV no município de Ribeirão Vermelho. Os dados obtidos permitiram fazer a
primeiro registro de leishmaniose visceral canina no município, assim como o primeiro relato
de 13 espécies de flebotomíneos na área de estudo. Ademais, os resultados demonstram a
presença de DNA de L. infantum em espécies com reconhecida importância no ciclo de
transmissão do parasito, e em espécies cuja importância vetorial ainda não foi reconhecida.
A partir destes resultados o município de Ribeirão Vermelho passa a ser classificado como
área de transmissão de leishmaniose visceral, com a necessidade de medidas de vigilância e
controle, a fim de evitar novos casos caninos e a ocorrência de casos humanos.