A cidade, como espaço construído e regido pela lógica capitalista, é palco de desigualdades socioespaciais. A terra urbana e a habitação, sob essa racionalidade, são transformadas em mercadoria, por meio da produção do espaço e da reprodução do capital. Nesses processos, há a sobreposição do valor de troca sobre o valor de uso, tornando essa nova mercadoria cara e inacessível à população de baixa renda. Reflexo social e estrutural da produção do espaço urbano e do papel desempenhado pelos agentes produtores é o deficit por habitação, que, para essa parcela da população, situa-se em cerca de 80% da demanda por moradia, conforme dados da FJP (2014). Essa realidade impõe ao Estado a adoção de planejamento urbano e políticas públicas que venham minimizar essa problemática. O Programa Minha Casa Minha Vida - PMCMV é uma política pública habitacional e macroeconômica que visa dar acesso à habitação às famílias que possuem renda de até 10 salários mínimos. Aliada a essa política, é fomentada a utilização do instrumento ZEIS pelos municípios, para mitigar regras de regularização fundiária e de uso e ocupação do solo para receber os empreendimentos vinculados ao programa. É nesse contexto que se insere o objetivo, proposto pela presente pesquisa de analisar o direito à moradia nas ZEIS instituídas em Montes Claros, a partir de 2009, vinculadas ao PMCMV, faixa 01. Os objetivos específicos consistem em estudar o planejamento e as políticas urbanas habitacionais adotadas pelo Município de Montes Claros; compreender os papéis dos agentes produtores do espaço envolvidos na instituição das ZEIS e os interesses de cada um deles nesse processo; e diagnosticar as ZEIS instituídas em Montes Claros no período de 2008 a 2018. Para tanto, utilizou-se de uma metodologia pautada em abordagem qualitativa e em pesquisa bibliográfica, documental e de campo – empregando nessa entrevista e registro iconográfico. Observou-se que em Montes Claros, o PMCMV, quantitativamente, ofereceu acesso à habitação a mais de 4.500 famílias de baixa renda, em suas fases 01 e 02, implementadas nos anos de 2011 a 2016. A instituição de ZEIS vazias - sejam as previstas pela Lei de Uso e Ocupação do Solo em 2009 ou para sediar os empreendimentos habitacionais do PMCMV - contribuiu para a expansão urbana, margeando os vetores sul, leste, nordeste, norte e noroeste da cidade. A criação das ZEIS consistiu numa forma de produção do espaço urbano que acirrou a segregação socioespacial já existente em Montes Claros, evidenciando os agentes produtores do espaço: Estado, grupos imobiliários e capitalistas. Verifica-se que a população residente nos 10 empreendimentos da faixa 01 do PMCMV não possuem seu direito à moradia observado, ainda que tenham tido acesso à unidade habitacional, considerando o critério localização, estabelecido pelo Comentário nº 4 do Comitê sobre os Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, da ONU. Por esse critério, as pessoas devem ter acesso ou facilidade de acesso a serviços como educação, saúde, transporte, lazer, o que não é ofertado para a população residente. Nenhum dos 10 residenciais habitados possui escola, creche, posto de saúde, posto policial, quadra de esportes, praça pública, o que evidencia a segregação socioespacial. O acesso a esses serviços e equipamentos encontra-se dificultado diante da localização escolhida para sediar o empreendimento, o que inviabiliza a concretização não só do direito à moradia, mas também do direito à cidade dessa parcela da população.