INTRODUÇÃO: O lupus eritematoso sistêmico (LES) é uma doença autoimune que pode acometer vários órgãos e sistemas e afeta principalmente mulheres em idade fértil. A qualidade de vida dos pacientes com LES em geral é prejudicada, pois além do comprometimento orgânico, os pacientes frequentemente apresentam ansiedade, depressão e dificuldades para lidar com a doença. A psicoterapia tem sido usada para complementar o tratamento clínico de pacientes com várias doenças crônicas, incluindo o LES, contudo não encontramos estudos avaliando os efeitos a longo prazo da psicoterapia na qualidade de vida, depressão, ansiedade e estratégias de enfrentamento em pacientes com LES.
OBJETIVOS: Objetivo primário: Avaliar os efeitos a longo prazo da psicoterapia psicanalítica breve de grupo (PPBG) na qualidade de vida de pacientes com LES. Objetivos secundários: 1. Avaliar os efeitos a longo prazo da PPBG nos níveis de depressão e ansiedade e nas estratégias de enfrentamento (coping) em pacientes com LES. 2. Comparar os resultados da PPBG nos subgrupos de pacientes com LES com sintomas de ansiedade e depressão. 3. Comparar os resultados da PPBG nos subgrupos de pacientes com e sem sintomas de ansiedade e depressão do grupo terapia.
MATERIAL E MÉTODO: Ensaio clínico controlado e randomizado, registrado no clinicaltrials.gov (número NCT01840709), em que participaram 80 pacientes com LES, em seguimento no ambulatório de doenças autoimunes do Hospital São Paulo/Universidade Federal de São Paulo (HSP/UNIFESP), divididos em dois grupos: grupo controle (GC n=43) e grupo terapia (GT n=37). O GT foi dividido em quatro subgrupos, com máximo de 10 pacientes, para receber PPBG em sessões semanais (90 minutos) por 20 semanas consecutivas, realizadas por psicóloga especializada. O GC permaneceu em fila de espera até ao final do estudo. Ambos os grupos continuaram o tratamento clínico ambulatorial. As participantes foram avaliadas no início do estudo (T1), após 20 semanas (T2) e após 24 meses do término da intervenção (T3), usando questionários autoaplicados, supervisionados por avaliador cego. Os questionários e escalas usados foram: classificação socioeconômica (critério ABIPEME), lista de sintomas (SLE-SSC), qualidade de vida (SLEQOL), ansiedade e depressão (HADS) e estratégias de enfrentamento coping (CSI). A avaliação clínica dos níveis de dano no LES (SLICC/ACR-DI) e da atividade da doença (SLEDAI) foi realizada pelos médicos do ambulatório. Critérios de inclusão: Sexo feminino; LES de acordo com os critérios de classificação do ACR, idade ≥ 18 anos, com seguimento mínimo de seis meses no serviço e assinatura do termo de consentimento. Critérios de não inclusão: Pacientes analfabetas; comorbidades físicas e mentais graves que comprometessem a participação, pacientes em tratamento psicológico externo ou incluídas em outros estudos. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da UNIFESP (CEP Nº 1655/09). Análise estatística: Duas análises de dados - análise I (por intenção de tratar) e análise II (58 pacientes que completaram o estudo). O programa usado foi o SPSS (Versão 17). Foram realizadas comparações intra e intergrupos no GT e GC. Variáveis quantitativas (Teste t-Student para a distribuição normal e Teste Mann-Whitney para distribuição não normal); variáveis categóricas em tempo único (Teste Qui-quadrado de Pearson); comparações da variância entre os grupos no decorrer do tempo (Teste ANOVA de medidas repetidas). Valor de p < 0,05 foi considerado significante. RESULTADOS: No início, GT e GC mostraram-se homogêneos em relação a todas as variáveis analisadas, incluindo as medicações. Após 20 semanas (T2), o GT mostrou melhora significativa em quase todos os domínios dos questionários aplicados e a maioria dos ganhos se manteve no seguimento de 24 meses (T3): quantidade e intensidade dos sintomas; 5 dos 6 domínios (atividade ocupacional, sintomas, tratamento, humor e autoimagem) e total do SLEQOL; 4 dos 8 domínios das estratégias de enfrentamento (aceitação e responsabilidade, fuga e esquiva, resolução de problemas e reavaliação positiva). Os níveis de ansiedade e depressão melhoraram no T2; no longo prazo, somente se manteve a melhora da ansiedade nas pacientes que terminaram o estudo. Os resultados dos subgrupos com sintomas de ansiedade e depressão foram semelhantes e as pacientes tratadas melhoraram, independente de terem esses sintomas. A mudança da medicação foi semelhante nos grupos. O dano da doença não se alterou. Houve melhora na atividade da doença em ambos os grupos.
CONCLUSÃO: O estudo mostrou que a PPBG teve efeitos positivos na qualidade de vida das pacientes com LES no longo prazo, ajudando-as a criar estratégias de enfrentamento mais adequadas para lidar com o estresse. A melhora da ansiedade se manteve nas pacientes que completaram o estudo. A melhora da depressão não se manteve no longo prazo. Os resultados da PPBG foram semelhantes nos subgrupos com sintomas de ansiedade e depressão e mostraram que as pacientes submetidas a psicoterapia se beneficiaram do tratamento, independente de terem esses sintomas. A técnica de PPBG mostrou-se útil para complementar o tratamento clínico no LES.