Esta Tese estabelece uma conexão entre a perspectiva gorgiana da linguagem, enquanto droga que age no psiquismo, e uma leitura profunda das raízes da antiga sofística, cuja análise mostra a que tradição, ou tradições, de pensamento, ligou-se Górgias Leontino. O segundo passo desta tese explora as ideias do pouco conhecido discípulo de Górgias, Alcidamante de Eleia. Este deu continuidade ao pensamento de Górgias, desenvolvendo uma perspectiva crítica própria sobre a potência da escrita, que ele compreendia como uma modalidade de linguagem subsidiária e inferior à fala. Se Górgias ficou conhecido como um mestre itinerante que possuía habilidade incomum para falar em público sem preparação prévia, coube a Alcidamante apresentar com mais detalhes essa técnica gorgiana de discursos improvisados (autoskhediastikê) à qual oporia a arte da escrita (graphiké). Para analisar a teoria da linguagem de Górgias, baseada na analogia entre palavras e drogas, examinaram-se ocorrências do phármakon e seus cognatos em textos da poesia e da medicina grega antiga, campos de saber que não só Górgias, como também Alcidamante, tomou para si como referenciais. A ligação de Górgias com uma antiga tradição retórica siciliana foi analisada seguindo um método genealógico que interpreta recepções distintas sobre a arte de falar, por Platão, Aristóteles, Cícero e Diógenes. Esse exame dá sustentação à hipótese de que as raízes sofísticas derivam de uma tradição que compreendia e valorizava as qualidades mágicas e terapêuticas da linguagem, assim como de uma outra, ligada ao campo das ações políticas dos antigos tribunais. Propõe-se aqui uma leitura da antiga tradição sofística grega, em que se cotejam as posições de Platão e de Aristóteles com outras perspectivas, sobre o privilégio dado pelos antigos sofistas às técnicas de linguagem. Dessas técnicas, importa-nos especialmente a análise do dispositivo argumentativo do eikós (esperado, provável, verossímil), fundamental nas práticas e teses de Górgias e de Alcidamante, e que teria sido teorizado, inicialmente, pelos especialistas em discursos políticos e forenses, Córax e Tísias, para posteriormente se transformar em um conceito filosófico. A tese conclui analisando a possibilidade de que Platão oculta traços e ideias de Alcidamante, através dos personagens Palamedes Eleático (no Fedro) e Estrangeiro de Eleia (no Sofista), com o intuito de revidar, com bom humor, a certas objeções que Alcidamante produziu sobre a arte de escrever (graphikê), movido por sua rivalidade com o condiscípulo Isócrates.