As dislipidemias alteram a captação periférica da glicose promovendo o descontrole glicêmico e a propensão ao desenvolvimento de doenças metabólicas crônicodegenerativas na população mundial. No entanto, doenças metabólicas expressam inúmeras alterações sistêmicas típicas que dificultam a compreensão do efeito isolado de cada uma e, portanto, limitam o tratamento. Modelos experimentais que promovem alterações na expressão gênica da apolipoproteína CIII (apoCIII), proteína componente da lipoproteína de muito baixa densidade, alteram a produção hepática da mesma e a captação periférica dos triglicerídeos, induzindo à hipertrigliceridemia e permitindo o estudo do efeito direto da mesma sobre o metabolismo da glicose, sem a interferência de outros fatores como a alteração da insulinemia. Ainda, o exercício altera o metabolismo dos triglicerídeos e da glicose, podendo proteger o indivíduo dos efeitos degenerativos das dislipidemias. Dessa forma, verificamos o efeito da hipertrigliceridemia induzida pela superexpressão gênica da apolipoproteína CIII e de uma sessão aguda de exercício, sobre a produção hepática de glicose e sobre os estoques hepático e muscular de glicogênio. Para isso, foi avaliado, em camundongos C57BL6 machos não transgênicos (NTG – trigliceridemia < 100mg/dL) e transgênicos (CIII – trigliceridemia > 200mg/dL), a produção hepática de glicose após jejum noturno em perfusão de fígado in situ, o conteúdo de glicogênio hepático e muscular, e os triglicerídeos, ácidos graxos livres e colesterol plasmáticos. Notou-se que, os mecanismos regulatórios e o metabolismo hepático e muscular da glicose encontram-se alterados pela hipertrigliceridemia no grupo CIII. Apesar dos parâmetros plasmáticos estarem elevados no grupo CIII, não houve diferença no tempo de corrida, no peso e na glicemia pré e pós exercício entre os grupos, o que demonstrou boa capacidade por parte do grupo CIII de regular a homeostase glicêmica quando submetido a desafios metabólicos como o jejum e o exercício. Entretanto, os mecanismos regulatórios e o metabolismo hepático e muscular da glicose foram alterados pela hipertrigliceridemia, pois na ausência de exercício houve redução da gliconeogênese hepática e aumento do estoque de glicogênio muscular no grupo CIII. No entanto, na presença de exercício o grupo CIII não apresentou alteração da gliconeogênese hepática, mas mostrou redução do estoque de glicogênio muscular. Dessa forma, é provável que a elevação da trigliceridemia per se, na ausência de outros fatores metabólicos associados, possa ser um dos fatores desencadeantes da síndrome metabólica, e o fígado e músculo esquelético possam ser os primeiros órgãos a manifestarem a instalação do quadro.