Esta pesquisa busca compreender os sentidos do lúdico, entendido como linguagem,
em roteiros de leitura desenvolvidos com crianças do ciclo de alfabetização. Apoia-se
na Sociologia da Infância para ampliar o conceito de lúdico – de ferramenta para
linguagem –, compreendendo-o como parte das culturas infantis e tendo o professor
como um adulto atípico (CORSARO, 2011). Centra-se na análise de roteiros de leitura
desenvolvidos em uma turma de crianças acompanhadas do 1º ao 3º ano (2013 a
2015). Os roteiros foram elaborados com base no seu potencial lúdico e contribuição
para o letramento literário (COLOMER, 2003, 2007; COSSON, 2014a, 2014b). Além
disso, sustenta-se no paradigma da pesquisa com crianças (GRAUE; WALSH, 2003)
e na potência da documentação pedagógica como elemento de reflexão do professor.
A prática realizada é vista como uma experiência de encontro entre a professora e as
crianças (LARROSA, 2002, 2015), em que se busca o sentido dessa experiência
(CONTRERAS; PÉREZ, 2010). A geração de dados decorre de dois movimentos: um
em torno da prática da professora analisando a sua documentação pedagógica; e,
outro, com as crianças, parceiras de ensino e pesquisa, por meio de registros e
conversas em grupo focal. Com base na análise feita, foram obtidos os seguintes
resultados: quanto aos roteiros de leitura, suas características constituintes estão: 1)
na potencialidade literária dos textos escolhidos, trabalhada de forma lúdica; 2) no uso
da leitura do texto, dando ênfase à palavra lida para construção do leitor; 3) na criação
de um ambiente de leitura que possibilitasse o faz de conta e a livre expressão das
crianças; 4) na preparação para ouvir o texto literário; e 5) no oferecimento de várias
brincadeiras e jogos possíveis de serem feitos a partir do texto, com os objetivos de
motivar/capturar o leitor, auxiliar no aprofundamento da compreensão do texto,
ajudando no ensino e reflexão sobre a língua (alfabetização/letramento). Quanto à
ludicidade mais especificamente, ela: (1) é evocada em sua forma mais direta nas
brincadeiras e nos jogos propostos; (2) aparece também como ferramenta para o
ensino de conhecimentos formais; e (3) pode ser capturada também no espaço
simbólico, de diálogo pedagógico. A ludicidade expressa-se como linguagem no modo
como professora e alunos se comunicam em aula. É entendida como linguagem
porque essa professora apresenta-se como diferente das demais – uma professora
atípica –, pois brinca e insere-se nas culturas infantis, não separando o mundo real do
imaginário, estabelecendo um entre-lugar que respeita a ludicidade como um dos
traços das culturas infantis, dispondo-se como uma professora que aprende a ser essa
professora atípica.