As doenças do sistema nervoso dos bovinos constituem um grupo de enfermidades
importantes, geralmente fatais, que muitas vezes ocorrem sob a forma de surtos, causando
prejuízos econômicos para a pecuária brasileira. No Brasil, diferentemente do que acontece no
hemisfério norte, a listeriose tem prevalência reduzida, e prevalecem as infecções virais.
Apesar da sua relevância, existem poucos levantamentos sobre a ocorrência dessas doenças no
país. Assim, este trabalho visa identificar as doenças neurológicas que acometeram bovinos
no estado do Paraná, entre os anos de 2009 e 2015, e descrever e comparar as alterações
presentes no LCR de bovinos acometidos por raiva ou por meningoencefalite por herpesvírus
bovino 5. A investigação aconteceu nas propriedades rurais onde os casos ocorreram. Foram
registradas as informações sobre a evolução das doenças nos bovinos afetados, e os prováveis
fatores de risco foram identificados. Todos os procedimentos de exame físico e colheita de
material foram padronizados. De acordo com o tempo de evolução e com a gravidade dos
sinais clínicos observados, os bovinos doentes eram mantidos vivos para acompanhamento da
evolução, ou eram submetidos à eutanásia seguida de necropsia. Fragmentos do sistema
nervoso e dos demais órgãos foram colhidos para exame histopatológico. O exame de
imunofluorescência direta e a prova biológica foram realizados em todos os bovinos que
morreram, com a finalidade de confirmar ou descartar o diagnóstico de raiva. Foram também
colhidas e examinadas amostras de LCR e de tecidos do SNC de bovinos naturalmente
acometidos pelo vírus da raiva (n=17) e por encefalite, causada por BoHV-5 (n=17). No LCR
foram realizadas as análises físicas e bioquímicas, assim como a contagem total e diferencial
de células. No SNC foram analisados fragmentos do telencéfalo, diencéfalo, mesencéfalo,
ponte, medula oblonga, medula espinhal, cerebelo e do gânglio do nervo trigêmeo. A
meningite foi classificada segundo o tipo e a quantidade das células inflamatórias. As lesões
observadas no parênquima encefálico e da medula espinhal que definiram a presença de
processo inflamatório foram manguitos perivasculares, gliose e nódulos gliais. Foram
investigados 236 bovinos com doença neurológica, sendo 85 casos de ocorrência individual e
151 casos distribuídos por surtos que ocorreram em 79 rebanhos. As doenças inflamatórias
determinadas por infecções (98/236; 41,5%) e as doenças tóxicas (91/236; 38,6%) foram as
principais, enquanto as causas degenerativas (10/236; 4,2%), metabólicas (9/236; 3,8%),
físicas (9/236; 3,8%), neoplásicas (4/236; 1,7%), e os defeitos congênitos (1/236; 0,4%)
ocorreram menos frequentemente. Os casos inconclusivos somaram 5,9% (14/236). O número
de leucócitos do LCR estava aumentado nos bovinos com raiva e com encefalite por BoHV-5,
com predomínio de células mononucleadas. Nos casos de raiva o número mediano de
leucócitos foi 5,4 vezes menor (p<0,001). Os números de células polimorfonucleadas
(p<0,001) e mononucleadas (p<0,001) foram mais elevados nos bovinos com
meningoencefalite por BoHV-5. A presença e a intensidade das lesões variaram, em cada
doença, de acordo com o local avaliado no SNC, entretanto o BoHV-5 causou meningite e
encefalite de maior intensidade do que o vírus da raiva, principalmente no telencéfalo e no
diencéfalo. Pode-se concluir que, a meningoencefalite por BoHV-5 e a raiva foram as doenças
de frequência maior e podem ser consideradas as mais importantes e embora as duas doenças
sejam provocadas por infecção viral e se caracterizem por meningoencefalite, as alterações
que determinam no LCR são muito distintas. Dentre as causas tóxicas, as intoxicações por
plantas se destacaram (63/91; 69,2%) e foram responsáveis por 26,6% de todos os casos.
Destacaram-se ainda a polioencefalomalácia, a meningoencefalite tromboembólica por
Histophilus somni e o botulismo.