O desenvolvimento intrauterino consiste em uma preparação dos recém-nascidos para a vida aérea. Além das relações filogenéticas, esta fase reflete as estratégias adotadas pelos mamíferos para maximizar a sobrevivência materna e neonatal, o que influencia fortemente na dinâmica de suas populações silvestres e na sua resiliência a distúrbios. Neste estudo, nós utilizamos amostras de 137 pacas (Cuniculus paca) gestantes, obtidas ao longo de 15 anos através de métodos colaborativos com caçadores locais na Amazônia, para descrever o desenvolvimento da morfologia externa e interna da espécie durante a fase intrauterina, discutindo a estratégia adotada pela espécie para sobrevivência do recém-nascido em comparação com outros roedores. Nos embriões/fetos adquiridos, foram realizados (i) a avaliação da probabilidade de presença de características externas ao longo da gestação; (ii) a biometria externa e uma estimativa da idade fetal e; (iii) medições do volume de órgãos torácicos e abdominais,
comparando suas proporções com os órgãos de adultos. O comprimento fetal total (CRL) variou de 0,6 cm a 24,6 cm. As características fetais apareceram na seguinte ordem cronológica: membros, pálpebras, pálpebras fusionadas, genitália, orelha externa, pelagem tátil, garras, pele, pintas, pelagem de cobertura, dentes e pálpebras abertas. Fetos com CRL>19,5 cm apresentaram todas as características externas avaliadas. A fórmula de crescimento da idade
fetal foi ∛W = 0,082 (t - 37,25), e a idade foi fortemente associada com CRL. O fígado mostrou uma tendência decrescente na sua proporção ao longo do desenvolvimento fetal, enquanto o volume relativo de órgãos gastrointestinais tubulares aumentou significativamente. Todos os órgãos, exceto o coração e o timo, apresentaram volumes relativos semelhantes entre fetos avançados e adultos. Este estudo revela que pacas produzem recém-nascidos precociais com estruturas adequadas para a sobrevivência com baixa dependência do cuidado parental. Além
disso, os neonatos da espécie são mais desenvolvidos do que os de outros roedores estudados. Embora a paca seja atualmente a espécie mais caçada na Amazônia, sua estratégia reprodutiva não é compatível com uma condição de presa, sugerindo que a espécie não é reprodutivamente preparada para responder a altas pressões de caça. Portanto, nossos resultados têm uma importância crítica para o diagnóstico clínico e o manejo reprodutivo in situ e ex situ da espécie.