INTRODUÇÃO: A relação entre voz e processamento auditivo é complexa e tem despertado maior interesse científico nas últimas décadas. Contudo, conhece-se pouco sobre a relação entre qualidade vocal e o processamento auditivo em indivíduos com e sem prática musical. OBJETIVOS: Verificar a qualidade vocal e os mecanismos fisiológicos de atenção seletiva e ordenação temporal em indivíduos com e sem prática musical. MÉTODOS: Participaram deste estudo 136 indivíduos distribuídos em três grupos: G1 = cantores, G2 = instrumentistas e G3 = sem prática musical, não cantores e não instrumentistas. O grupo G1 foi subdividido em G1.1 = cantores instrumentistas e G1.2 = somente cantores. Os sujeitos foram submetidos à avaliação vocal por meio de análise perceptivo-auditiva (APA) da gravação de suas vozes faladas, categorização das mesmas e autoavaliação de um possível problema de voz por meio da Escala de Sintomas Vocais – ESV. Os participantes tiveram seu processamento auditivo central avaliado pelos seguintes testes: Teste de Padrão de Frequência (TPF), Teste de detecção de intervalos aleatórios (RGDT), Teste de identificação de dissílabos através de tarefa dicótica (SSW), Fala com Ruído Branco e Sentenças Sintéticas com Mensagem Competitiva (SSI). Foi estudada a correlação entre voz e habilidades auditivas. RESULTADOS: A maioria dos indivíduos, em todos os grupos pesquisados, não apresentou desvio vocal, o qual, quando ocorreu, foi de grau discreto. Houve diferença significativa entre G2 e o subgrupo G1.1, no Grau Geral do Desvio 0 (G1.1 = 46,15% e G2 = 18,18%) e 1 (G1.1 = 46,15% e G2 = 75%). O mesmo ocorreu entre G2 e o subgrupo G1.2 para o Grau Geral do Desvio 1 (G1.2 = 50% e G2 = 75%). G1 referiu maior número de sintomas vocais que os demais grupos com médias superiores à nota de corte do ESV, sendo que G1. 2 apresentou média de 23,86 e G1.1 de 21,70; mulheres possuíram maior pontuação no ESV total (20,55) e Limitação (11,25). O subgrupo G1.1 demonstrou maior habilidade auditiva de ordenação temporal, no TPF, tanto na modalidade Humming (OD = 100% e OE = 99,75%), quanto na Nomeação (OD = 96,89% e OE = 97,77%), sendo que o G3 apresentou as menores médias. O sexo masculino foi melhor tanto no TPF (Humming OD = 97,74% e OE = 97,66%; Nomeação OD = 94,15% e OE = 94,60%), como no RGDT (4,48), na análise da amostra total. Correlações de força apenas negligenciável foram encontradas entre os diferentes testes do processamento auditivo central, o grau geral do desvio vocal na análise perceptivo-auditiva da qualidade da voz e os diversos escores do protocolo Escala de Sinais e Sintomas Vocais. CONCLUSÃO: A qualidade vocal de músicos e não músicos correlacionou-se com seu processamento auditivo, embora com força negligenciável. Constatou-se que os cantores referem mais sintomas vocais em relação aos demais grupos, por provável conscientização de seu instrumento, assim como as mulheres, quando comparadas aos homens. Quanto ao processamento auditivo, houve grande variação em todos os grupos. Contudo, músicos, principalmente cantores instrumentistas, demonstraram melhor habilidade auditiva de ordenação temporal, sugerindo que o estudo e vivência musical possam ser os responsáveis por este desempenho. Para este mesmo aspecto, em relação à influência do sexo nas habilidades auditivas, verificou-se que os homens possuem melhores resultados nos testes de ordenação e resolução temporal.