Esta investigação tem como tema central a memória infantil. Inscreve-se em um campo mais amplo de pesquisa que articula os últimos estudos foucaultianos (que focalizam a constituição do sujeito), algumas ferramentas conceituais benjaminianas (como memória, história e narração) e as discussões acerca do Estudo em Casa (Homeschooling) promovidas por Michel Apple. A esse referencial teórico, somam-se ainda autores como Hannah Arendt, Francisco Ortega e Carlos Roberto Cury. A tese propõe-se a analisar os modos pelos quais as crianças se constituem narrativamente por meio de suas memórias de infância. Metodologicamente, o percurso escolhido para privilegiar a memória e a fala infantil foi a perspectiva teórico/metodológica da pesquisa com crianças, baseada, em grande medida, no campo da Sociologia da infância e dos Estudos da Criança. Foram realizadas onze oficinas na Oficina de Arte Sapato Florido, na Casa de Cultura Mário Quintana, em Porto Alegre (RS), no período de agosto a outubro de 2015. As oficinas contaram com a participação de onze crianças, seis meninas e cinco meninos, com idades entre 05 e 12 anos, e foram organizadas a partir de proposições investigativas que contaram com diversos materiais como os livros de literatura infantil Guilherme Augusto Araújo Fernandes (2014) e A incrível fuga da cebola (2012), a poesia Memórias inventadas: a infância (2003), o filme de curta-metragem Dona Cristina Perdeu a Memória (2000), o filme de animação Divertida Mente (2015), duas propagandas televisivas Palhaço (2014) e Brinquedos Estrela (1987), as obras da Série Rever-retratos Ressiginificados (2012), além das relíquias e dos registros fotográficos das próprias crianças. Além de elevar a criança à condição de depoente privilegiado do seu próprio contexto, portanto, de narradora do seu tempo, espaço e cultura, foi possível observar, pelas narrativas infantis um elemento central: a emergência de uma infância não-escolar(izada), chamada Homeschooling ou Estudo em Casa. Trata-se, de um conjunto de práticas, micropolíticas que colocam em jogo as relações que são estabelecidas neste tempo com as verdades escolares. Mais do que isso, esboça-se, devido a prevalência decisiva deste tema na fala das crianças, uma forma de viver que se esgota politicamente, já que evita, a todo custo, os riscos impostos por este espaço chamado escola, ao passo que não evita os riscos impostos por um espaço chamado lar. Portanto, foram as narrativas infantis que permitiram delinear aquilo que denominamos neste estudo como um modo homeschooler de vida e suas implicações ao escolar.