A concepção bakhtiniana de linguagem como interação de sujeitos históricos, que produzem enunciados únicos e irrepetíveis em situações específicas de comunicação, leva à compreensão da autoria como aspecto relevante do discurso. Ao usar a linguagem, os sujeitos dialogam com outras vozes e posicionam-se em relação a elas, efetuando escolhas que singularizam seu dizer, revestindo-o de um maior ou menor grau de autoria. A partir desses pressupostos, esta pesquisa tem como objetivo investigar a construção da autoria em diários de leitura produzidos por estudantes de uma turma do Curso Técnico Integrado em Zootecnia, do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte (IFRN), Campus Apodi. Partiu-se da noção de autoria presente em Bakhtin (2003), como também do conceito de indícios de autoria presente em Possenti (2002; 2007; 2013). Ambos os autores propõem a autoria como um trabalho sobre a linguagem, no qual o sujeito assimila e reelabora o discurso alheio, utilizando recursos estilísticos para materializar as diversas vozes sociais e posicionar-se em relação a elas. Após a realização de uma sequência didática para o estudo do gênero conto maravilhoso, os alunos leram cinco contos da escritora brasileira Marina Colasanti e registraram, em seus diários de leitura, suas impressões, sensações e pensamentos a respeito das narrativas. O corpus submetido à análise constitui-se de doze diários de leitura, nos quais foram identificados três tipos de indícios de autoria: interdiscursos, relativos ao agenciamento das vozes alheias no enunciado; relações valorativas, referentes às escolhas léxico-gramaticais efetuadas pelos produtores dos diários; intercalações, concernentes à sobreposição de planos enunciativos em cujos espaços os sujeitos expõem sua subjetividade. As análises desses indícios apontam para a presença marcante de discursos advindos das esferas cotidiana e religiosa, em detrimento daqueles provenientes das esferas sócio-histórica, educacional, literária e artística; também sugerem uma relação de proximidade com o objeto diário e com os interlocutores, além de revelarem, por meio da escolha de palavras lexicais, os posicionamentos dos alunos em relação aos contos e aos temas suscitados pela leitura; por fim, as análises indicam uma maior desenvoltura no uso de intercalações nos diários com maior volume textual e maior profundidade no registro das impressões de leitura. Os indícios de interdiscursos e relações valorativas apareceram em todos os diários, porém somente em um quarto do corpus verificou-se a presença de intercalações. Tais resultados sugerem que o diário de leitura constitui-se como um instrumento profícuo para acompanhar o desenvolvimento dos processos de leitura e escrita dos estudantes, possibilitando a assunção de um discurso autoral, contudo faz-se necessário o desenvolvimento de outras atividades metaenunciativas para elevar o grau de autoria dos textos produzidos nesse gênero