A Segurança Alimentar e Nutricional é a realização do direito de todos ao acesso regular e permanente à alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, tendo como base práticas alimentares promotoras de saúde. A Escala Brasileira de Insegurança Alimentar (EBIA) é uma escala psicométrica que mede diretamente a insegurança alimentar em nível domiciliar, classificando-a em leve, moderada ou grave. A Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde da Criança e da Mulher (PNDS-2006/07) foi um dos inquéritos nacionais que, em conjunto com indicadores e instrumentos de mensuração em diversas áreas, utilizou a EBIA para descrever as prevalências de Segurança Alimentar e Nutricional na população. Dados secundários da PNDS-2006/07 foram utilizados para analisar a associação entre insegurança alimentar e variáveis sociodemográficas e biológicas em domicílios brasileiros com crianças menores de cinco anos. A variável segurança alimentar foi dicotomizada em segurança alimentar ou insegurança alimentar leve (SA/IAL) versus insegurança alimentar moderada ou grave (IAM/G), os resultados do primeiro estudo apontaram para alta prevalência de IAM/G concentrada nas regiões Norte ou Nordeste (N/NE) (30,7%), nas classes econômicas D ou E (34%) e em beneficiários de Programas de Transferência de Renda (PTR) (36,5%). O modelo de análise multivariada constatou que os riscos sociais (beneficiário de PTR), regionais (N/NE) e econômicos (classes D e E) eram de 1,8, 2,0 e 2,4, respectivamente. Agregando-se os três riscos observou-se que 48% dos domicílios encontravam-se em IAM/G, ou seja, crianças e adultos experimentaram a sensação de fome nos três meses anteriores ao inquérito. O segundo estudo mostrou alta prevalência de IAM/G (Food Insecurity) entre domicílios com mulheres com escolaridade menor que 8 anos de estudo (25,7%), que viviam sem parceiro (25,9%) e que conviviam com três ou mais crianças residindo sob o mesmo teto (29,3%). Em adição, demonstrou alta prevalência de IAM/G em residências com crianças menores de 5 anos, as quais tiveram pelo menos uma hospitalização por diarreia ou pneumonia nos três meses anteriores à entrevista (25,9%), tinham peso-para-idade <-2,0Z (32,1%) ou não comeram carne (20,5%) ou frutas, verduras e legumes diariamente nos sete dias anteriores à entrevista (19,3%). Independente das variáveis demográficas (macrorregião e situação de domicílio) e domiciliares (classificação econômica, PTR, condições de moradia, escolaridade materna, estado civil e número de crianças), o modelo de análise multivariada mostrou associação entre desfechos de saúde de crianças menores de cinco anos residindo em domicílios com IAM/G e pelo menos uma hospitalização por diarreia ou pneumonia nos doze meses anteriores à entrevista (RP 1,3, IC95% 1.1; 1.6), desnutrição segundo o indicador peso-para-idade WAZ<-2.0Z (RP 1,4, IC95% 1,1; 1,7) e não comer carnes (RP 1.2, IC95% 1,1; 1,4) ou frutas, verduras e legumes (RP 1.7, IC95% 1,3; 2,3) nos sete dias anteriores à entrevista. Encontrou-se associação entre viver em insegurança alimentar moderada ou grave e efeitos adversos diretos à saúde em crianças menores de cinco anos. Essa relação, moldada pelo ambiente em que a criança vive, pode representar um fator importante na transmissão intergeracional da desigualdade econômica, impactando negativamente na prosperidade dos futuros cidadãos brasileiros.