No final dos anos 80, foram iniciadas as negociações políticas para concepção do regime
climáticoglobal. A proteção das florestas tropicais não estava inserida no âmbito desses
acordos internacionais, mas, com o passar do tempo, o tema ganhou destaque nas arenas de
negociação sobre mudanças climáticas, dando início a institucionalização do mecanismo de
REDD+, voltado à redução de emissões de gases de efeito estufa por desmatamento e
degradação florestal.Os povos indígenas, especialmente pela contribuição de seus territórios a
prevenção e contenção do desmatamento e, consequentemente, a redução de emissões de
gases de efeito estufa na atmosfera, foram levados a uma posição de destaque no âmbito das
discussões sobre o REDD+, dando ensejo a diferentes abordagens ideológicas e
posicionamentos sobre a participação indígena nesse mecanismo. A institucionalização do
REDD+ nos diferentes níveis é marcada por outras indefinições, entre estas aquelas
relacionadas ao seu financiamento e escala.Alguns defendem que os recursos devem advir de
doações voluntárias ou pagamentos por resultados, realizados pelos países desenvolvidos aos
países detentores de florestas tropicais. Outros sugerem a comercialização dos créditos
gerados pelos projetos ou sua “fungibilidade” com emissões em outros locais. Existemaqueles
que apoiam as duas estratégias. Neste contexto, os fundos socioambientais são apontados para
atuar na intermediação de recursos destinados ao financiamento de iniciativas de redução do
desmatamento e da degradação florestal e manutenção de estoques florestais, assim como na
repartição de benefícios advindos de projetos de REDD+, especialmente em âmbito local. No
Brasil, foram constituídos os dois primeiros fundos socioambientais indígenas para
desempenhar esses papéis: o Fundo Kayapó e o Fundo Paiter Suruí. Estesinstrumentos
refletem, na prática, os modelos que estão sendo pensados para o financiamento ou
implementação do mecanismo de REDD+ nos diferentes níveis, já que os recursos destinados
ao primeiro tem origem em pagamentos por resultados realizados pelo governo da Noruega ao
Brasil e os recursos do Fundo Paiter Suruí são oriundos da comercialização de créditos no
mercado voluntário de carbono. Esta dissertaçãoteve o objetivo de realizar uma análise
institucional desses fundos, buscando compreender como estão sendo pensados, estruturados
e encarados pelos diferentes atores envolvidos em seu processo de concepção e as
particularidades de cada modelo. Além disso, procurou entender como as indefinições e
divergências presentes no processo de institucionalização do mecanismo de REDD+ nos
diferentes níveis de governança podem influenciar e ser replicadas na concepção
dessesinstrumentos de abrangência local. A partir da contextualização a institucionalização do
REDD+ e da inserção dos fundos socioambientais neste contexto, assim como da coleta de
dados secundários e primários sobre os casos estudados, verificou-se que os dois modelos não
cumprem (ou cumprem parcialmente) salvaguardas definidas para o mecanismo de REDD+,
em especial aquelas relacionadas a direitos dos povos indígenas, principalmente o direito de
autodeterminação. As divergênciasem torno do mecanismos de REDD+ nos diferentes níveis
também se refletem na esfera local e influenciam o desenho e funcionamento dos fundos
socioambientais estudados.