Protocolos que incluem a coadministração de bleomicina, etoposide e cisplatina (protocolo BEP) têm sido eficazes contra o câncer testicular; entretanto, causam efeitos deletérios no organismo, inclusive sobre a reprodução. O resveratrol pode ser considerado como um potencial aliado para reverter este panorama, devido às suas propriedades anticâncer, anti-apoptótica, anti-inflamatória e antioxidante. O presente estudo teve por objetivo investigar o efeito da coadministração de resveratrol contra os danos reprodutivos causados pela administração do protocolo BEP, usado em clínica, porém adaptado para ratos, a partir da peripuberdade. Foram utilizados 172 ratos, distribuídos em quatro grupos: Controle Sham (CS); Resveratrol (R); Bleomicina, Etoposide e Cisplatina (BEP) e Resveratrol + Bleomicina, Etoposide e Cisplatina (R-BEP). A partir dos 36 dias pós-parto (dpp), ratos dos grupos R (n=44) eR-BEP (n=42) foram tratados com resveratrol, por gavagem, administrado em doses únicas de 300 mg/Kg de peso corpóreo/dia. A partir do 41o dpp, ratos do grupo RBEP foram submetidos à coadministração de BEP, por via intraperitoneal (i.p.), durante três semanas consecutivas, utilizando-se o seguinte protocolo: 3,50 mg/kg/dia de etoposide e 0,70 mg/kg/dia de cisplatina por cinco dias consecutivos, com dois dias de intervalo em cada semana e 0,35 mg/kg de bleomicina, no segundo dia de cada semana. Os animais do grupo BEP (n=42) foram tratados unicamente com bleomicina, etoposide e cisplatina, via i.p.; e os do grupo CS receberam salina
fisiológica 0,9% (via i.p.) e carboximetil-celulose (por gavagem), o veículo do resveratrol (n=44). A eutanásia foi realizada em duas idades: i) 60 dpp (Experimento 1) e ii) 113 dpp (Experimento 2). Tanto aos 60 como aos 113 dpp foram investigados parâmetros: biométricos testiculares e epididimários; morfométricos e estereológicos testiculares; espermáticos quantitativos. O número de células germinativas em apoptose (pelo cálculo da densidade numérica de células TUNEL-positivas) e a análise histopatológica testicular também foram efetuadas nas duas idades. Aos 60 dpp foram ainda determinados (as): dosagens de hormônios sexuais (testosterona e estradiol) no plasma (P) e no fluido intratesticular (FIT); concentrações de malondialdeído e óxido nítrico, no testículo, para estudo do estresse oxidativo e parâmetros espermáticos qualitativos (atividade mitocondrial; integridade acrossômica; integridade do DNA; morfologia e motilidade – CASA/HTM-IVOS). Aos 113 dpp foi calculada a estimativa do número total de espermatogônias RB1- positivas. Nem aos 60 nem aos 113 dpp foram observadas diferenças significantes entre os grupos CS e R, para quaisquer parâmetros analisados. Aos 60 dpp, os animais dos grupos BEP e R-BEP apresentaram redução dos seguintes parâmetros: peso corpóreo; pesos do epidídimo e testículo; diâmetro dos túbulos seminíferos, inclusive em estágios andrógeno-dependentes; altura e área do epitélio seminífero; número de espermatozoides nas regiões do epidídimo; dosagem de testosterona no P e no FIT.
Acentuada hipotrofia do epitélio seminífero (depleção de células germinativas) também ocorreu, nesta idade, em ambos os grupos (BEP e R-BEP). Quando comparados entre si os grupos BEP e R-BEP, não foram observadas alterações significantes destes parâmetros, com exceção da área de epitélio seminífero (RBEP> BEP). Ainda aos 60 dpp, houve aumento da peroxidação lipídica, no testículo, em ambos os grupos BEP e R-BEP. Aos 60 dpp, a integridade do DNA dos espermatozoides como também parâmetros de motilidade, de vigor (VCL) e de progressão (VAP e VSL) se mostraram similarmente alterados, em ambos os grupos R-BEP e BEP, quando comparados aos grupos CS e R. Todavia, a dosagem de testosterona no FIT e alguns parâmetros indicativos de qualidade dos espermatozoides (morfologia, atividade mitocondrial e integridade acrossômica) apontam para uma ação benéfica do resveratrol contra o dano causado pela quimioterapia, pois houve uma melhora significante destes no grupo R-BEP em comparação ao grupo BEP. Contudo, o grupo R-BEP mostrou significantes alterações em todos os parâmetros analisados, em comparação ao grupo CS. Aos 113 dpp, os animais dos grupos BEP e R-BEP apresentaram semelhantes alterações dos parâmetros reprodutivos, conforme observado aos 60 dpp, além de um número reduzido da estimativa do número total das espermatogônias RB1-positivas. Houve aumento da ocorrência de morte de células germinativas por apoptose nos grupos BEP e R-BEP (60 e 113 dpp), mas, aos 60 dpp, este parâmetro mostrou-se mais baixo em animais do grupo R-BEP em comparação aos do grupo BEP. O modelo de estudo aqui descrito propiciou uma análise ampla dos efeitos do protocolo BEP, com ou sem a coadministração de resveratrol, sobre tipos diferentes de células germinativas evidenciando, principalmente, o impacto dos dois tratamentos (BEP e R-BEP) na sobrevivência destas células e na qualidade dos gametas já que a eutanásia foi realizada em dois momentos diferentes: i) um dia (Experimento 1) e ii) 54 dias (Experimento 2) após o término do tratamento (aos 59 dpp). A redução da ocorrência de apoptose em células da linhagem germinativa, a preservação parcial da área de epitélio seminífero, a melhora de alguns parâmetros espermáticos qualitativos e da dosagem de testosterona no FIT, observadas nos animais do grupo R-BEP (60 dpp), em comparação ao grupo BEP, indicam uma ação positiva produzida pelo tratamento com resveratrol, em coadministração com o BEP. Por outro lado, o resveratrol não conferiu ação protetora suficiente contra o dano da quimioterapia, que possibilitasse a restauração do epitélio seminífero após um período completo da espermatogênese (53 dias, 113 dpp). Períodos mais longos de recuperação poderiam ser ofertados aos animais com o fim de melhor esclarecer o papel do resveratrol na possível restauração tardia do epitélio seminífero e na recuperação parcial das reservas espermáticas.