A presente tese discute, por via de uma prosa que margeia tanto procedimentos etnográficos quanto os da micro-história, diferentes dimensões relativas à mediação, inclusive a religiosa, que informam a diversidade de relações de um determinado acontecimento. O processo judicial que condena três espíritas kardecistas em Paris no ano de 1875, documento central desta tese, é compreendido como um drama social encravado no universo do texto jurídico, aqui compreendido como a duração da fala, e como forma de difusão da mediação estatal da França pós-revolucionária. As questões visibilizadas pelos documentos primários sugerem um grande número de analogias com os temas abordados por parte da teoria antropológica que lhe é contemporânea. Assim, tal teoria é refletida, não como aporte utilitário de um sistema de citações utilizadas como suporte de um argumento, mas como testemunha de seu próprio mundo, solidária com muitos dos problemas postos tanto pelo espiritismo como de seus acusadores, o que os reúne ao redor do problema posto por variações a respeito das mediações e do poder tutelar. É assim que textos canônicos como os de Tylor, Durkheim, Mauss e Tarde são discutidos como uma versão particular de teoria nativa junto a Kardec, Rivail, Frégier e Bédarride, dando outra inteligibilidade para um processo que condena os kardecistas de Paris, o que por sua vez acrescenta outras dimensões daquilo que podemos reconhecer como sendo o conceito e a disciplina da antropologia.