Introdução. O mercado das bebidas alcoólicas no Brasil não é regulado: existem pontos
de venda espalhados por todo o território nacional vendendo esse artigo a preços muito
baixos, tornando o acesso a essa substância extremamente fácil. Dessa forma, ao
contrário do que se observa nos países desenvolvidos, a prevalência do consumo de
álcool em nosso país, a exemplo do observado em outros países em desenvolvimento,
tem experimentado preocupante crescimento nas últimas décadas, num movimento
paralelo ao da melhora do poder aquisitivo da população. Contudo, quanto maior o
consumo médio de etílicos em determinada população, maior a incidência de problemas
relacionados. Sendo assim, o alto índice de acidentes de trânsito associados ao consumo
de álcool é uma consequência óbvia. Diante dessa constatação, o governo federal, em 19
de junho de 2008, sancionou a Lei 11.705, que alterou o Código de Trânsito Brasileiro,
estipulando o limite de concentração sanguínea de “zero de álcool” para as pessoas que
assumem a direção de um veículo, numa das raras políticas nessa área.
Objetivo. O presente estudo tem por objetivo comparar as prevalências das mortes por
acidentes automobilísticos na cidade de São Paulo antes e depois da lei 11.705.
Método. Os dados foram coletados dos arquivos do Instituto Médico Legal de São Paulo,
tendo sido selecionados todos os laudos necroscópicos e exames toxicológicos de todos
os óbitos registrados na cidade de São Paulo, dentro do período 01/06/2007 a 30/06/2009,
perfazendo o total de 10969 registros. Foram selecionados laudos de todos os sujeitos
com idade acima de 18 anos envolvidos em acidentes fatais de trânsito. Tomando como
referência a data da promulgação da lei 11.705 em 19 de junho de 2008 que alterou o
Código de Trânsito Brasileiro determinando a concentração limite de álcool no sangue, a
saber, 0,2 g/l, dois grupos foram formados de acordo com a data de óbito. O primeiro
grupo foi composto por indivíduos mortos em acidentes de trânsito durante o período
correspondente aos 12 meses anteriores e o segundo grupo foi formado por todos os
indivíduos com registro de óbito durante os 12 meses posteriores à referida lei. Os grupos
foram então comparados quanto ao número de óbitos nos quais havia presença de álcool
no sangue, no sentido de determinar a influência dessa lei sobre a mortalidade no trânsito
relacionada ao consumo de etílicos.
Resultados. No primeiro grupo, correspondente ao período de 1 ano antes da
promulgação da lei 11.705/2008, foram detectadas 169 mortes. No segundo grupo,
correspondente ao período de 1 ano após a promulgação da referida lei, foram detectadas
126 mortes, representando uma diminuição de 27% no número de mortes. Vale ressaltar
que a maior parte dessas mortes ocorreu na faixa mais jovem dos indivíduos analisados:
entre os 18 e os 28 anos.
Conclusão. Em um mercado tão carente de regulação, fica demonstrado o resultado
positivo da lei 11.705/2008 com o impacto direto sobre a diminuição da mortalidade.
Contudo, a validade dessa constatação não deve se restringir a essa importante
diminuição. Ao contrário, deve servir de base para que outras políticas voltadas ao álcool
sejam implementadas e que a aplicação das políticas existentes sejam sustentadas ao
longo do tempo.