O presente trabalho trata do processo de instauração da educação de surdos no Brasil do
século XIX, com o objetivo de averiguar saberes e ideias linguísticas (AUROUX, 1992)
inscritos na formulação e circulação de materiais pedagógicos pelo então Imperial Instituto de
Surdos-mudos. Neste período, o Brasil Imperial espelhava-se muito na França, bem como em
sua Civilização e Ensino, resultando na criação de escolas Brasileiras que eram inexistentes
até então. Como exemplo, o Instituto dos Surdos-Mudos, conforme designação encontrada no
Decreto n. 4.046, de 19 de dezembro de 1867, atual Instituto Nacional de Educação de Surdos
(INES) que nos dias de hoje, se situa em Laranjeiras, no Rio de Janeiro. Com base no suporte
teórico-metodológico da Análise de Discurso (PÊCHEUX, 2011; ORLANDI, 2009) e na
História das Ideias Linguísticas (AUROUX, 1992, 2009; ORLANDI, 2001, 2013), foram
analisados os seguintes instrumentos linguísticos: a iconografia do professor francês Pierre
Pélissier (1856); e a iconografia do professor brasileiro Flausino da Costa Gama (1875),
ambos surdos; ademais, a obra A palavra (1878) de J. J. Valade-Gabel, que consta na primeira
biblioteca e não foi traduzida à época; bem como os manuais difundidos pelo então diretor
Tobias Leiteem um gesto tradutório sobre manuais franceses: Compendio para o ensino dos
surdos-mudos (1881), lições extraídas do Méthode pour enseigner aux surds-muets (do
professor J.J Vallade Gabel, 1871) e publicações próprias com: seu Relatório como diretor
(1870) e As notícias (1877). Para tal, leva-se em conta o recorte e o gesto de tradução, pois ao
contrário do pensamento de senso comum que há, a iconografia brasileira e o compêndio não
são cópias e/ou tipos de tradução das francesas. Além disso, o ato de traduzir é um ato
político e de autoria. Vale ressaltar que, sobre o século XIX, Eni Orlandi (2013, p.14) afirma
que nesse tempo, os estudos histórico-comparativos da linguagem predominavam. Outrossim,
Dezerto (2013, p.187) salienta que “(...) são ideias sobre a língua francesa produzidas na
França que compõem os saberes a serem transmitidos nesse momento”, acerca do ensino
brasileiro, o qual se espelhava no modelo francês. Assim, o processo de escolarização no
Brasil se dá em determinadas condições de produção (ORLANDI, 2019) da formação de
saberes e ideias linguísticas na Educação de surdos no Brasil. Segundo Auroux, (1992, p.7)
“entre os mitos expandidos pela historiografia das ciências da linguagem tal como ela foi
estabelecida no século XIX, na época em que reinava a hegemonia do comparativismo (...)”.
Desta forma, esta pesquisa traz um recorte e uma análise de instrumentos linguísticos para se
compreender o processo de institucionalização de saberes linguísticos na educação dos surdos
no Brasil no XIX.