O presente estudo propõe discussão em torno das representações socioespaciais da cidade de Cuiabá-MT, segundo crianças de quatro escolas da rede municipal da mesma cidade. Objetiva compreender as significações das crianças a respeito do espaço público, pensando a relação criança e cidade como aspecto importante do desenvolvimento infantil. As crianças são vistas enquanto atores sociais, que constroem sua identidade e sua condição cidadã nas relações sociais, em contato com os conhecimentos que circulam em seu entorno. A cidade é entendida enquanto objeto de representação social presente e atuante na constituição da subjetividade infantil. A orientação teórica articula a Teoria Histórico-Cultural (VIGOTSKI, 1996, 2000, 2006, 2009, 2010) e a Teoria das Representações Sociais (MOSCOVICI, 2003), esta no diálogo com os estudos de Jodelet (1982, 2001, 2002, 2007, 2010). O estudo na área da Geografia sobre o desenvolvimento e ocupação da cidade de Cuiabá (ROMANCINI, 2005) também auxilia na análise e compreensão dos dados, bem como os estudos de Tuan (1980, 1983), sobre as noções de lugar, topofilia e topofobia, os estudos de Moraes (2002), sobre os processos urbanos de territorialização e feudalização, e a proposta de Sennett (1990), sobre o espaço narrativo. O procedimento metodológico adotado foi a recolha de desenhos da cidade inspirados na proposta dos mapas cognitivos (ALBA, 2011), acompanhados de entrevista semiestruturada, de 40 sujeitos subdivididos em quatro grupos de 10 crianças, cada subgrupo pertencente a uma das quatro escolas municipais selecionadas. Realizou-se análise de conteúdo do material coletado a partir dos mapas da cidade, mediante leitura flutuante, conforme sugerido pela referida técnica de análise (BARDIN, 1977), seguida da análise implicativa por meio do software Cohesive Hierarchical Implicative Classification (CHIC). As entrevistas foram transcritas e processadas pelo software Analyse Lexicale par Contexte d´um Esemble de Segments de Texte (ALCESTE), auxiliando também na interpretação dos mapas cognitivos e possibilitando a análise dos critérios de topofilia e topofobia, por meio da identificação dos núcleos de significação (AGUIAR; OZELLA, 2006). Por fim, realizou-se análise compreensiva da entrevista e respectivo mapa cognitivo de dois sujeitos. Os resultados revelam que as crianças percebem a cidade a partir de dois grandes eixos: eixo I (regiões Porto e Goiabeira) e eixo II (regiões Coxipó e CPA), que evidenciam indícios da existência de uma tensão entre a tradição e a modernidade permeando as representações socioespaciais das crianças a respeito da cidade, a mesma tensão histórica que se perpetua em Cuiabá a partir dos anos 60-70, segundo estudo de Romancini (2005). Além disso, nota-se que as crianças avaliam a cidade e orientam seus deslocamentos pelo critério da estética, da violência e das suas relações afetivas com outros atores sociais, revelando que o afeto e a significação em relação aos lugares estão intimamente ligados ao afeto entre as pessoas que neles convivem. Em face disso, percebe-se que criança e cidade se constroem e reconstroem em uma constante relação de reciprocidade, esta que se revela em vivências urbanas e ainda demonstra a importância da cidade como uma grande sala de aula para a construção da condição cidadã.