Introdução: Os erros de refração são a principal causa de deficiência visual em
escolares e quando não corrigidos podem afetar o aprendizado e o rendimento
escolar. A avaliação da progressão dos erros de refração em escolares e de
fatores individuais, ambientais e familiares que possam influenciá-los podem
fornecer dados epidemiológicas importantes quanto ao perfil refrativo ocular
dessa população. A miopia é o principal erro de refração e evidências atuais
revelam aumento da sua prevalência e progressão em populações asiáticas e
também urbanas. As principais consequências dessa progressão são a
deficiência visual, as morbidades relacionadas a miopia e o impacto na saúde
pública, socioeconômico e do risco de cegueira. O conhecimento desses dados
epidemiológicos também pode contribuir para o planejamento e implementação
de ações de saúde ocular nessa população. Objetivos: Determinar a progressão
dos erros de refração e avaliar possíveis fatores de risco associados. Métodos:
Este estudo populacional longitudinal foi realizado de setembro de 2008 a
dezembro de 2009. A população estudada originou-se de um estudo basal prévio,
realizado em escolares de baixa renda, com idade de 11 a 14 anos, provenientes
de escolas públicas do ensino fundamental no ano de 2005. A amostragem foi
realizada por conglomerados em três distritos: Vila Jacuí, Ermelino Matarazzo e
São Miguel Paulista. Os escolares com deficiência visual por erros de refração
não corrigidos foram convidados para novo exame oftalmológico sob cicloplegia.
Para identificar e avaliar fatores de risco para a progressão de erros de refração
foi aplicado um questionário de informações familiares e outro para caracterização
de hábitos de atividades visuais dos escolares. Para análise estatística foram
consideradas as seguintes variáveis: conglomerado, sexo, idade, cor da pele,
estado refrativo, acuidade visual, média do equivalente esférico, uso de óculos e
fatores de risco para progressão identificados no questionário aplicado aos
escolares, além da escolaridade dos pais e uso de óculos pelos mesmos.
Resultados: Dos 218 jovens do estudo basal elegíveis para o novo estudo, 138
foram examinados, com taxa de resposta de 63,30%. Todos os escolares míopes
no estudo basal permaneceram míopes no estudo longitudinal; dos 16 emetropes,
4 (25%) tornaram-se míopes, 2 (12,5%) hipermetropes e 10 (62,5%)
permaneceram emetropes. Entre os hipermetropes, 28 (80%) permaneceram
hipermetropes e 7 (20%) tornaram-se emetropes. Para progressão de -0,50D, 101
(74,26%) jovens apresentaram evolução miópica e para -1,50D, 37 (22,80%)
tiveram progressão negativa. A progressão miópica foi estatisticamente maior nos
olhos míopes (P=0,047) e nos que apresentaram acuidade visual <20/63 no olho
de melhor visão (P=0,02). O uso de óculos por ambos os pais dos participantes
teve associação significante tanto para progressão miópica de -0,50 D (EE)
(P=0,011) como para progressão de -1,50D (EE) (P=0,055). O uso da visão em
tarefas para perto mostrou associação significante com a progressão miópica
(P=0,032). Conclusões: A progressão dos erros de refração na população de
escolares de baixa renda do município de São Paulo foi miópica. Em 74% dos
escolares houve uma progressão miópica de pelo menos -0,50D (EE) e esta
progressão foi maior nos olhos que já eram míopes e nos olhos com visão inicial
não corrigida, compatível com deficiência visual moderada no estudo basal. O uso
de óculos por ambos os pais, assim como atividades mais intensas para perto
foram fatores de risco para progressão miópica. A progressão do astigmatismo foi
miópica e associada ao valor do astigmatismo basal, ou seja, quanto menor o
valor do astigmatismo basal, menor foi a chance de progressão negativa.