A doença mixomatosa da valva mitral (DMVM) é a afecção mais
frequentemente diagnosticada na prática da cardiologia veterinária em âmbito mundial. O princípio teórico da utilização do anlodipino no paciente com DMVM é a redução da pós-carga, de modo a diminuir a fração regurgitante e, consequentemente, a sobrecarga de volume tanto do átrio quanto do ventrículo esquerdos. Objetivou-se avaliar o efeito do anlodipino em cães com DMVM estágio C no retardamento da evolução da doença, aumento da sobrevida e na melhora da qualidade de vida, de
índices ecocardiográficos e parâmetros clínicos. Este foi um estudo clínico randomizado duplo-cego placebo-controle, no qual foram recrutados cães com DMVM estágio C que foram tratados com terapia convencional (furosemida, espironolactona, enalapril e pimobendan) e randomizados em dois grupos, um que recebeu anlodipino e outro placebo. O tempo de acompanhamento dos cães foi de 10 meses. Os desfechos primários foram: edema pulmonar cardiogênico, ascite associada a efusão
pleural, evolução para o estágio D da DMVM e morte por causa cardiogênica, e também foi analisado o tempo de ocorrência de cada desfecho. Foram incluídos 40 cães, sendo 18 no grupo anlodipino e 22 no grupo placebo. A dose média de anlodipino que o grupo tratado recebeu foi 0,31 mg/kg a cada 24 horas. Em relação a furosemida, a dose média diária do grupo placebo (6,27 mg/kg/dia ±2,60) foi significantemente maior do que o grupo anlodipino (4,31 mg/kg/dia ±2,16, p=0,041)
apenas no T7. O grupo placebo apresentou aumento gradual da dose média diária de furosemida ao longo dos tempos de avaliação, sendo a dose no T7 e T9 (6,27 mg/kg/dia ±2,60 e 5,96 mg/kg/dia ±2,38) significantemente maior do que a dose no T1 (4,12 mg/kg/dia ±2,01, p=0,004). A dose média diária de espironolactona foi significantemente maior no grupo placebo do que no grupo anlodipino no T7 (2,83 mg/kg/dia ±0,77 vs. 2,16 mg/kg/dia ±0,41, p=0,008) e T9 (2,87 mg/kg/dia ±0,98 vs. 2,06 mg/kg/dia ±0,39, p=0,003). O pimobendan apresentou diferença na sua dose
média entre os tempos no grupo placebo (p<0,001). Em relação a pressão arterial sistêmica, na comparação entre os grupos, houve diferença apenas no T3 aonde o grupo anlodipino apresentou valor significantemente menor (118 mmHg ±13,81) do que o grupo placebo (128 mmHg ±20,05, p=0,028). O valor de creatinina no grupo placebo no T9 foi 1,95 mg/dL (±2,03), significantemente maior do que a basal (1,21
mg/dL ±0,40) e no T7-10 (1,16 mg/dL ±0,48) e T5 (1,29 mg/dL ±0,31, p=0,002). Em relação ao ecocardiograma, o DIVEsN no T5 no grupo placebo (0,96 ±0,25) foi significantemente maior do que no grupo anlodipino (0,82 ±0,29, p=0,039). Foi avaliada a ocorrência, risco relativo e tempo médio em dias para atingir cada desfecho primário e não houve diferença entre os grupos. O estudo não foi capaz de evidenciar
efeito do anlodipino em aumentar a sobrevida ou retardar a evolução da doença, entretanto, o tratamento com este fármaco demonstrou-se seguro para cães com DMVM estágio C e propiciou o uso de doses menores de medicamentos da terapia convencional em comparação ao grupo placebo.