O vírus da Hepatite E (HEV) é a principal causa de hepatite em países em desenvolvimento e ocidentais, responsável por infectar mais de 20 milhões de pessoas, ocasionando aproximadamente 60 mil mortes por ano no mundo. A transmissão do HEV foi confirmada a partir de suínos, bovinos e camelos, para primatas humanos e não humanos; por esta razão, a agricultura tradicional envolvendo a criação de diversas espécies e a proximidade entre elas pode potencialmente expandir as fontes zoonóticas e contribuir com a alta prevalência de HEV. Recentemente, o material genético do HEV foi detectado em amostras de leite e fezes de vacas leiteiras nos continentes europeu, asiático e africano, sugerindo a possibilidade de infecção em humanos através da ingestão de leite contaminado com o vírus. Diante da provável transmissão zoonótica do vírus para humanos através do leite, pela prática comum de criação mista de animais e pela circulação do HEV em suínos no Estado de Mato Grosso, o objetivo deste estudo foi investigar a excreção do vírus em vacas leiteiras, a partir de amostras de fezes e leite, através da identificação da ORF1 e ORF2 do HEV por meio da técnica de transcrição reversa seguida de reação em cadeia da polimerase (RT-PCR). Neste estudo, 430 amostras de fezes e leite de bovinos leiteiros do Estado do Mato Grosso foram coletadas e avaliadas quanto à presença do HEV por meio de técnicas moleculares. Foram selecionados 14 municípios em quatro mesorregiões do Estado, sendo que 215 vacas leiteiras provenientes de 49 propriedades foram amostradas. As principais características dos rebanhos foram levantadas por meio de um questionário epidemiológico. As propriedades selecionadas apresentavam a criação de diferentes tipos de animais domésticos conjuntamente, como suínos (71,4%), equinos (61,2%), caprinos (4%), ovinos (18,3%), aves (51%), cães (32,6%) e gatos (8,1%). Embora estudos anteriores tenham demonstrado a circulação do HEV nos suínos em Mato Grosso, neste estudo não foi possível a amplificação das ORF1 e ORF2 nas amostras fecais e de leite dos bovinos avaliados e, apesar de alguns autores sugerirem que as criações mistas podem ser fator determinante para a infecção nos bovinos, não foi observado uma associação positiva desta prática com a excreção viral em bovinos da mesma propriedade. Neste sentido, este estudo representa a primeira investigação molecular da excreção de HEV em bovinos no Brasil e ressalta-se a importância da realização de estudos adicionais abrangentes envolvendo este agente viral para verificar a circulação do vírus em bovinos, assim como investigar a participação de outras espécies animais na epidemiologia desta virose.