A hanseníase é uma doença infectocontagiosa causada pelo Mycobacterium leprae, uma bactéria intracelular obrigatória que infecta macrófagos, células dendríticas, queratinócitos e células de Schwann e pode causar deformidades e incapacidades físicas, além de danos psicológicos pela estigmatização dos doentes. O Brasil está entre os países que mais notificam casos de hanseníase no mundo e o estado do Tocantins apresenta elevada taxa de detecção, sendo classificado como hiperendêmico. O objetivo do estudo foi identificar fatores sociais e individuais associados à ocorrência de hanseníase em municípios da região de saúde do Bico do Papagaio, norte do estado do Tocantins, no período de 2008 a 2018. Realizou-se um estudo seccional, descritivo, com dados secundários dos casos de hanseníase notificados em municípios da região de saúde do Bico do Papagaio – TO no período de 2008 a 2018, registrados no Sistema de Informação de Agravos de Notificação – SINAN. Adicionalmente foi realizado um estudo caso-controle não pareado para avaliar possíveis fatores determinantes da doença na região, por meio da realização de entrevista com pacientes notificados para hanseníase nos anos de 2016 a 2018. O estudo epidemiológico revelou registro de 1257 casos novos, dos quais 173 (13,76%) ocorreram em menores de 15 anos. Houve predomínio da doença no sexo masculino (54,49%), na faixa etária de 15 a 59 anos (65%), em indivíduos pardos (69,93%), analfabetos ou que cursaram até o ensino fundamental (60,76%) e moradores da zona urbana (74,14%). A forma multibacilar foi mais frequente (58,63%) assim como dimorfos (38,66%) e com até 5 lesões (56,56%). O Grau de incapacidade física 2 (GIF) foi registrado para 3,98% dos notificados e o comprometimento de nervos em 25,38%. A baciloscopia foi positiva em 41,46% (209/504) dos indivíduos submetidos ao exame e foi ignorada ou não realizada em 59,9% das notificações. Reações hansênicas foram registradas em 12,25% dos notificados. O coeficiente de detecção geral médio na população geral foi de 59,89/100 mil habitantes e em menores de 15 anos de 8,88 casos/100 mil. O grau de incapacidade física 2 teve taxa de detecção de 23,24 casos/1 milhão de habitantes. A distribuição espacial da doença demonstrou predomínio de áreas hiperendêmicas ou de muita alta endemicidade ao longo do período estudado. No estudo caso controle uma maior chance da ocorrência de hanseníase foi observada em indivíduos negros (OR=2,56; p=0,001) e pardos (OR=1,36, p=0,015), com baixa escolaridade (OR=3,23, p=0,006) e com ocupações que não exigem formação escolar (OR=4,24, p<0,001). Apareceram também como associadas à ocorrência de hanseníase moradias com até 4 cômodos (OR=4,02; p<0,001), que possuiam abastecimento de água (OR=19,56, p<0,001) e que recebiam a visita de um agente de saúde (OR=2,87, p=0,016). Indivíduos que não receberam a imunização com a BCG (OR=2,2; 0,014) e que relataram caso anterior de hanseníase na família (OR=4,35; p<0,001) também tiveram mais chance de infecção. Os dados evidenciam que na região de saúde do Bico do Papagaio o diagnóstico da hanseíase ainda ocorre de forma tardia, com elevada ocorrência de casos multibacilares, principalmente entre menores de 15 anos. O convívio íntimo entre indivíduos em famílias mais numerosas e domicílios pequenos, sem qualquer proteção imunológica e com presença de casos da doença, são fatores de risco para a infecção por hanseníase e em famílias assistidas pelo sistema público de saúde a chance de diagnóstico da doença é maior.