A investigação parte da realidade de precarização dos grupos da chamada economia popular e solidária, relacionada, entre outras razões, à sua preponderante condição de informalidade – o que, sob o prisma jurídico, pode ser traduzido no fato de que os coletivos não assumem a forma de uma pessoa jurídica, ou se personificam sob formas inadequadas para o exercício de atividades econômicas, permanecendo em um lugar de desvantagem ao produzir e comercializar bens e serviços. Propõe-se, neste sentido, identificar e analisar as peculiaridades dos processos de personificação jurídica do trabalho associado popular, partindo-se das ações de pesquisa e extensão da Incubadora de Iniciativas da Economia Popular e Solidária da Universidade Estadual de Feira de Santana (IEPS-UES), de que participam trabalhadores/as urbanos/as e rurais do município de Feira de Santana, no período entre 2009 e o presente. O esforço investigativo justifica-se pela importância que assume a discussão, ainda lacunosa, acerca do papel do direito nos processos de organização de formas coletivas alternativas ao trabalho subordinado, seja sob o prisma das estratégias de manutenção da hegemonia do capital, seja da perspectiva das lutas emancipatórias das classes trabalhadoras. O processo investigativo deu-se sob a metodologia da pesquisa participante, realizada pela autora enquanto integrante da IEPS-UEFS, sob os vetores da participação coletiva e interdisciplinar de acadêmicos/as e dos/as trabalhadores/as protagonistas do problema de pesquisa, do diálogo entre diferentes tipos de conhecimento e da ação política de transformação social. Do ponto de vista epistemológico, as bases do materialismo histórico-dialético servem de balizas para a articulação das informações levantadas e para as sínteses teóricas alcançadas. A estrutura do texto compõe-se: da apresentação e discussão dos aspectos metodológicos e da caracterização histórica da economia popular e solidária considerando o contexto espacial da pesquisa e sua relação com o fenômeno da informalidade; da caracterização e sistematização dos tipos de pessoas jurídicas assumidos pelos sujeitos coletivos no trabalho associado popular, refletindo-se tanto sobre o que representam de obstáculo para os/as trabalhadores/as quanto, dialeticamente, sobre sua relação com as lutas populares em torno de modos alternativos de produzir e trabalhar; da análise das perspectivas de mudança no horizonte da legalidade estatal; e, por fim, da formulação de novas perguntas, que relacionam o problema da personificação coletiva à produção do comum e de um outro direito que lhe corresponda. A pesquisa constata que mesmo os tipos mais adequados à personificação dos grupos no sistema jurídico brasileiro vigente (associações, sociedades simples e cooperativas) reproduzem a lógica excludente do sujeito de direito burguês e do mercado capitalista. De forma dialética, no entanto, as lutas dos/as trabalhadores/as revelam, através dos seus múltiplos modos de enfrentar e subverter os formatos jurídicos que se lhes impõem, que o direito estatal é também um espaço contraditório de produção de fissuras à rede de sentidos hegemônica, e que, em tais fissuras, o comum e outras racionalidades jurídicas vão igualmente sendo gestados, para além do capital.