Resumo:
Células do sistema imunológico inato que participam da resposta inflamatória
têm sido muito estudadas e, ao longo das últimas décadas, sua importância para a
resposta regenerativa em diferentes contextos biológicos tem recebido grande atenção.
O anfíbio Xenopus laevis apresenta alta habilidade regenerativa durante o estágio de
larva, regenerando integralmente sua cauda após amputação. Em particular, embora
nosso grupo tenha demonstrado que a atividade da enzima remodeladora da cromatina
Histona Desacetilase (HDAC) é necessária para a regeneração da cauda da larva após
amputação, os mecanismos celulares e moleculares envolvidos nesses eventos ainda não
estão elucidados. Assim, este trabalho tem como objetivo caracterizar as bases celulares
e moleculares da capacidade regenerativa da cauda de Xenopus laevis dependente da
atividade HDAC. Análises histológicas mostraram que 24 hpa (horas após a amputação)
a inibição da atividade HDAC (iHDAC) levou à uma desorganização da estrutura
arquitetônica tecidual da cauda associada à uma deposição difusa de colágeno. Por
citometria de fluxo estudamos a dinâmica populacional das células após a amputação e
observamos que 24hpa os animais iHDAC apresentavam um perfil de células mais
complexas (alta granulosidade e tamanho) no broto regenerativo quando comparado ao
grupo controle. Utilizando análises histológicas clássicas e reação citoquímica para alfanaphthyl butirato esterase identificamos células com características morfológicas
compatíveis com macrófagos e monócitos. Observamos também que o tratamento com
iHDAC implicou na diminuição da capacidade fagocítica das células presentes no broto
regenerativo bem como na diminuição significativa dos níveis do mRNA para MMP7,
indicando que a resposta inflamatória possa estar atenuada na ausência da atividade
HDAC. Células presentes no broto regenerativo se mostraram positivas para F4/80, um
marcador clássico de macrófagos, mas análises por western blot não evidenciaram
diferenças quantitativas desse marcador entre os grupos controle e iHDAC. Para melhor
caracterizar se as células presentes no broto regenerativo pertencem de fato à linhagem
mielóide, utilizamos a linhagem transgênica de Xenopus LURP-GFP. LURP é o
homólogo do marcador Ly6 de camundongos e identifica células de origem mielóide,
neutrófilos e/ou monócitos. De fato, apesar de observarmos 24hpa um aumento no
número de células GFP+
em animais iHDAC, os níveis do mRNA de LURP endógeno
não se mostraram alterados, sugerindo a presença de células com baixa expressividade
de LURP (LURPlow). Já 72hpa, apesar de observarmos que não houve diferença no
número de células LURP+ entre controle e iHDAC, observamos um aumento nos níveis
do mRNA de LURP endógeno, sugerindo a predominância de células com alta
expressividade de LURP (LURPhigh). Como a hematopoese em Xenopus ocorre em duas
ondas separadas no tempo e no espaço, à semelhança de mamíferos, decidimos
investigar qual das duas ondas de diferenciação contribuem para a geração das células
recrutadas durante a regeneração. De fato, apenas a primeira onda de diferenciação
mielóide contribui para geração das células mielóides recrutadas durante a regeneração.
Esses dados são compatíveis com a diminuição da habilidade regenerativa após ablação
de progenitores mielóides que são especificados por Spib, um master gene envolvido na
diferenciação mielóide das células oriundas da primeira onda de diferenciação mielóide.
Corroborando esses achados, o tratamento com iHDAC resultou em aumento dos níveis
de expressão de spib e de seu alvo mpox (neutrófilos), em 72hpa, indicando a presença
persistente de neutrófilos e, portanto, da resposta inflamatória. De fato, apesar de
análises morfológicas não apontarem diferenças na quantidade de corpúsculos lipídicos
(CL) por área de broto regenerativo, observamos estruturas elétron densas em animais
iHDAC que sugerem alterações qualitativas na composição química de CLs indicando
que a atividade HDAC pode modular a síntese de mediadores lipídicos, prejudicando a
resolução da inflamação. Para testar se mediadores lipídicos são componentes da
regeneração em Xenopus, realizamos a inibição farmacológica da enzima 12/15
Lipoxigenase (12/15 LOX) pelo flavonóide Baicaleina durante a regeneração. De fato, a
inibição da atividade 12/15 LOX resultou na redução da capacidade regenerativa e na
diminuição dos CLs 72hpa. Em seguida, buscamos detectar níveis mensuráveis tanto de
prostanóides quanto de resolvinas, até então não descritas no contexto da regeneração.
Fomos capazes de detectar prostanóides e resolvina D1 tanto em 24 quanto em 72 hpa,
indicando a presença desses mediadores durante os eventos regenerativos. Em conjunto,
estes dados mostram que células mielóides da primeira onda de diferenciação são
indispensáveis para a regeneração de Xenopus de maneira dependente da atividade
HDAC. Dado que diferentes iHDACs estão sendo testados na clínica, e que dois deles
já estão aprovados para uso clínico, a utilização desses fármacos para modular a
dinâmica de células mielóides pode surgir como uma relevante estratégia a ser
translacionada para a clínica visando modular adequadamente o potencial regenerativo
de diferentes tecidos e órgãos.
Abstract:
Innate immune system cells that participates in the inflammatory response has
been extensively studied over the last decades and their importance to the regenerative
response within different biological contexts has received great attention. Xenopus
laevis frog has great regenerative ability, during its tadpole stages, being capable to
completely regenerate its tail after an amputation. In particular, although our group has
demonstrated that the remodeling chromatin enzyme Histone Deacetylase (HDAC) is
necessary for tadpole tail regeneration after amputation, molecular and cellular
mechanisms involved in these events are not yet elucidated. Therefore, this work aims
to characterize the molecular and cellular bases of Xenopus laevis tail regenerative
ability depending on HDAC activity. Histological analyses showed that inhibition of
HDAC activity (iHDAC) 24hpa (hours post amputation) led to a disruption of the tail
tissue architectonic structure associated to diffuse collagen deposition. Using flow
cytometry, we studied cell populational dynamics after amputation and saw that in
24hpa iHDAC animals presented complex cellular profile (higher granularity and size)
at the regenerative bud when compared to control group. Using classical histological
analyses through alpha-naphthyl acetate esterase, we identified cells presenting
morphological features resembling macrophages and monocytes. We also observe that
iHDAC treatment implies on lower phagocytic ability at cells on the regenerative bud,
as well as on the significant decrease on mmp7 mRNA levels, indicating that the
inflammatory response may be attenuated in the absence of HDAC activity.
Regenerative bud cells are positive to F4/80, a classic macrophage marker, but western
blot analyses do not show quantitative differences of this marker between control and
iHDAC groups. To better characterize if the regenerative bud cells are from myeloid
lineage, we used the Xenopus LURP-GFP animal. LURP is the mice Ly6 homolog and
identifies cells with myeloid origins, neutrophils and/or monocytes. In fact, although we
saw in 24hpa an increase at the GFP+
cells at iHDAC animals, LURP mRNA levels are
not altered, suggesting the presence of low LURP expressivity cells (LURPlow). In
72hpa, besides the observation of no difference concerning to the number of LURP+
between control and iHDAC groups, we observed an increase at the LURP mRNA
levels, suggesting the predominance of high LURP expressivity cells (LURPhigh). Since
Xenopus hematopoiesis occurs in two waves separated in time and space, like in
mammals, we decided to investigate which of the two differentiation waves contributes
to the generation off cells recruited during regeneration. In fact, only the first myeloid
differentiation wave contributes to the generation of myeloid cells recruited during
regeneration. These data are compatible with the decrease of regenerative ability after
myeloid progenitor ablation, which are specified by spib, a master gene involved in
myeloid differentiation of cells arising from the first myeloid differentiation wave.
Confirming these results, iHDAC treatment results in increased spib expression levels
and its target mpox (neutrophils), in 72hpa, indicating the persistent presence of
neutrophils and therefore, inflammatory response. In fact, despite morphological
analyses did not show differences between lipid bodies (CL) amount per area of the
regenerating bud, we observed electron dense structures in iHDAC animals, that
suggests qualitative alterations in the chemical CL composition, indicating that HDAC
activity may modulate lipid mediators synthesis, impairing inflammation resolution. To
test whether lipid mediators are components of Xenopus regeneration, we
pharmacologically inhibited the 12/15 lipoxygenase (12/15 LOX) enzyme through the
flavonoid Baicalein, during regeneration. Indeed, the inhibition of 12/15 LOX activity
reduced both the regenerative ability and CLs in 72hpa. Next, we sought to detect
measurable levels of prostanoids and resolvins, not yet described in Xenopus
regeneration context. We were able to detect prostanoids and resolving D1 both in 24
and 72hpa, indicating the presence of these mediators during regenerative events.
Together, these results show that first wave-differentiated myeloid cells are
indispensable to Xenopus tail regeneration in a HDAC activity dependent manner.
Giving that different iHDACs are being tested in clinic, and that two of them are already
approved for clinical use, the utilization of these drugs to modulate the myeloid cells
dynamic may arise as a relevant strategy to be translationed to clinic, aiming to properly
modulate different tissues and organs regenerative potential.