A normalidade como exigência aparece como um traço importante nas políticas de subjetivação contemporâneas com incidência no trabalho em um Serviço residencial terapêutico (SRT). Com os enunciados da igualdade, dos direitos e de uma sociedade livre de manicômios, a estratégia de desinstitucionalização desinveste a clausura e pode permitir a emergência de um sujeito de direitos, liberal, incluído na cidade, no lazer, trabalho, consumo. Fazer de um serviço de saúde (terapêutico) uma casa, é um dos enunciados problematizados nesta investigação em um SRT do bairro Cidade Ademar, em São Paulo. No dia a dia, encontramos certo hibridismo casa-serviço com uma multiplicidade de tensões nos modos de gestão da vida. Atravessada pelo discurso da desinstitucionalização e da reforma psiquiátrica, esta pesquisa tentou dar dizibilidade ao que parecia instituinte e institucionalizado nesta proposta de desinstitucionalização em curso. Emergiram marcas, mínimos gestos, experiências com os que habitam uma casa- SRT enredando casa, cidade, trabalhadores da saúde e políticas de subjetivação. A produção de narrativas foi uma das estratégias para dar espessura a essa investigação; elas arrastam marcas da chegada à casa, da apropriação do espaço e da tessitura de relações. Os exercícios narrativos foram sondagens não para elogiar, se opor ou fazer militância, mas permitir questionamentos vitais e a possibilidade de encontrar distintas relações com a loucura, a casa, com o insustentável que diariamente nos atravessa. Acompanhar vidas em uma casa, trabalhar ali, pesquisar, foi se fazendo em blocos, em peças: um amor, um quintal, uma alegria, um quarto, uma saúde, uma sala, uma morte, uma política, um armário etc. Com esses problemas e peças muito concretas, interessou pensar a desinstitucionalização como uma instituição. Com essa aposta, a pesquisa buscou engendrar imagens verossímeis, tentou criar visibilidades, acompanhar um projeto de desinstitucionalização em nós, com o que deseja e fala em nós no dia a dia. Através de imagens narrativas, tentou-se expressar uma experiência de casa-SRT com suas topologias em disputa, zonas de asilo-político-liberador, asilo-manicomial, normopatia, perscrutando, em certos casos, um SRT asilo político que refugia, protege e que também pode ser uma "escola de alienação administrativa". São pequenos blocos, escritos de vida com moradores saídos do asilo-hospital psiquiátrico, agora habitados por outras tensões na casa-SRT. Uma sustentação difícil, com efeitos diversos, incidindo em políticas na amorosidade, num trabalho de tatear aquilo que vibra e acontece no dia a dia de uma casa-SRT, com experiências vitais, desencaixadas, liberações da dita humanização, em parte adesão civilizatória, ajeitando modos de existência. Trata-se de uma aposta ético-clínico-política de pesquisa em blocos, peças de uma produção, sondagens de vidas não domesticadas, com docilizações, disciplina, controle, em que se acompanha a ocupação de um quarto, um quintal, e não mais um pátio de hospício, com bons e maus encontros, desinvestindo o adestramento e a submissão mesmo com a insistência de muros que se erguem nas relações com a saúde e a loucura.