Os gatos são animais que podem se infectar por parasitos do gênero Leishmania spp. No
entanto, pouco se conhece sobre a relação das manifestações clínicas da leishmaniose felina
(LF) com as respostas imunológicas desses animais. Neste trabalho, nós realizamos
diagnóstico laboratorial, clínico, quantificação de IgA, IgG e IgM anti-L. (L.) infantum,
quantificação de linfócitos T CD4+ e CD8+ nas células mononucleares do sangue periférico
(PBMC) e análise do transcriptoma afim de identificar as diferenças das resposta imune
humoral e celular de gatos naturalmente infectados por L. (L.) infantum. Foi avaliado um total
de 166 gatos, onde, 15,06% (25/166) apresentaram anticorpos anti-L. (L.) infantum pelo
ELISA e 53,61% (89/166) pela RIFI, enquanto que pela PCR convencional (cPCR), 3,61%
(6/166) apresentaram DNA do protozoário Leishmania no sangue, com 100% de identidade à
espécie L. (L.) infantum (GenBank: KY379078.1). Desses seis animais, três apresentaram
amastigotas de L. (L.) infantum em esfregaços do aspirado de linfonodo e/ou medula óssea no
exame parasitológico e um teve a Leishmania isolada em cultura de aspirado de linfonodo.
Assim, os gatos com testes sorológicos, parasitológicos, moleculares e de sequenciamento
positivo para L. (L.) infantum, compuseram nosso grupo infectado (G1), enquanto que o
grupo controle (G2) foi composto por seis gatos saudáveis. De acordo com anamnese clínica
observamos que a magreza, alopecias e lesões de pele estavam entre os sinais clínicos mais
frequentes entre os felinos. A quantificação de IgG, IgA e IgM totais anti-Leishmania foram
significativamente maiores no G1 em comparação ao G2, (p = 2,966x10-6; p = 0,0002348 e p
= 2,945x10-5, respectivamente). Nos exames hematológicos dos gatos detectamos a redução
das plaquetas (p = 0,0062, p < 0,01) nos gatos G1 em relação ao G2, enquanto os leucócitos
foram aumentados para gatos G2 (p = 0,014, p <0,05). Em relação aos parâmetros
bioquímicos, os gatos infectados (G1) apresentaram aumento na concentração de proteína
total (p = 4,4832e-06, p <0,01) com baixa albumina (p = 0,0065, p <0,01) e baixa aspartato
aminotransferase (p = 0,0025, p <0,01) fora do intervalo de referência para a espécie. Pela
citometria de fluxo observamos diferença significativa entre os linfócitos T CD4+ do G1 em
relação ao G2 (p = 0.0427), entretanto, o mesmo não aconteceu para as subpopulações de
linfócitos T CD8+ (p = 0.06199). Pela análise do transcriptoma destacamos a “down”
regulação das vias metabólicas que controlam a atividade da proteína arginina desaminase
(PAD), o processo de hemopoiese, a resposta ao estresse e o desenvolvimento do sistema
imunológico e a “up” regulação da via sinalizadora do fator de crescimento dos fibroblastos
(FGF) e do gene CXCR6 que participa da via sinalizadora da inflamação mediada pela
sinalização de quimiocinas e citocinas. Possivelmente, a regulação negativa ou positiva dessas
vias pode indicar a imunorregulação, por parte do parasita, como mecanismo de evasão do
sistema imune do hospedeiro. Em contrapartida, a “down” regulação das vias sinalizadoras de
ativação das células B (gene MAP3k2) de ativação das células T (gene LCP2), dos receptores
Toll (gene TLR4) associado a “down” regulação dos genes IFNAR1, IFNGR2, IL13RA1,
IL10 e IL1B nos gatos infectados (G1) do nosso estudo, indicam imunorregulação por parte
do sistema imune felino em controlar o parasitismo intracelular por L. (L.) infantum, mas que
não foram suficientes para controlar a progressão da doença. Esses resultados trazem as
primeiras informações para elucidação da resposta imunológica às infecções por L. (L.)
infantum em felinos.