A violência é um fenômeno complexo e multifacetado, vivenciado constantemente por pessoas em situação de rua de diversas formas, como violência física, sexual, simbólica, estrutural e institucional; e por diversos autores, como o Estado, o aparato policial, a sociedade civil e outras pessoas em situação de rua. A população em situação de rua é vista a partir de representações pejorativas, as quais legitimam as relações de poder e as diversas violências praticadas. Com isso, essa dissertação objetiva identificar as representações sociais da violência para pessoas em situação de rua. Utilizou-se como embasamento teórico, a Teoria das Representações Sociais, na interface com a Teoria da Atribuição de Causalidade e a Teoria Motivacional do Coping, além de articulá-las com as pesquisas científicas sobre população em situação de rua e violência. Para compreender a temática, buscou-se responder aos objetivos por meio de uma abordagem multimétodos, de natureza exploratória e descritiva e de corte transversal. O estudo consistiu em entrevistas semiestruturadas realizadas com 91 pessoas em situação de rua, com mais de 18 anos e que possuíam no mínimo um mês de permanência nas ruas da Grande Florianópolis/SC. O instrumento foi elaborado pela pesquisadora e abarcou questões envolvendo as representações sociais da violência, os aspectos influenciadores, as estratégias de enfrentamento utilizadas frente a esse estressor e questões sociodemográficas. A análise de dados envolveu Classificação Hierárquica Descendente, com o auxílio do software IRaMuTeQ, análise categorial temática, análise descritiva (média, desvio-padrão e frequência) e correlacional (correlação de Spearman), realizada com auxílio do software PSPP. Os resultados, apresentados na forma de artigos, indicaram aspectos representacionais relacionados a definições da violência em si, da violência em situação de rua, das explicações sociais, aspectos influenciadores, estratégias de enfrentamento, história de vida, da desumanização vivenciada, de ações violentas sofridas e praticadas nas ruas e a naturalização e banalização das violências. As narrativas contemplam histórias que abarcaram a complexidade da sobre (vivência) na rua e das violências neste contexto e as suas relações no cotidiano. Verificou-se que em geral, os participantes atribuíram a violência perpetuada pelo outro a causalidades internas e quando praticada por si próprio foram por motivos externos. Os fatores influenciadores da violência elencados pelos participantes foram de conteúdos já existentes na representação dominante, a qual individualiza práticas violentas. Em relação às estratégias de enfrentamento, os resultados apontaram para uma prevalência da utilização de estratégias mal adaptativas. Constatou-se também diferenciações entre falas de participantes do Movimento Nacional de População em Situação de Rua, e não participantes, havendo falas “mais politizadas” entre os que participavam. Para além, observou-se a violência como constitutiva da vida nas ruas, sendo esta forma de se relacionar parte de uma sociabilidade complexa que envolve regras, códigos e morais próprias. Assim, utilizar da mesma violência, na maioria das vezes física, torna-se uma estratégia de enfrentamento necessária muitas vezes para a sobrevivência. No entanto, constatou-se que essas práticas podem contribuir negativamente para a saúde mental desta população. Com isso, considera-se necessárias intervenções para que sejam reduzidos os danos associados às violências. Para isso, é relevante compreender este fenômeno integralmente em sua complexidade ao pensar em políticas públicas e práticas profissionais efetivas e humanizadas, levando em conta todo o contexto político, estrutural, histórico, cultural e relacional que estas pessoas vivenciam. Apesar de algumas limitações do estudo, considera-se que este pode contribuir para novas práticas e olhares sobre a temática. Por fim, sugere-se novos estudos sobre esta temática, para que se possa dar maior suporte empírico a esta pesquisa.