Este estudo investiga discursos sobre saúde mental produzidos pelo sistema judiciário no Brasil. Para tanto, parte de princípios teóricos e analíticos da Linguística Sistêmico Funcional (Halliday & Matthiessen, 2014), da Análise Crítica do Discurso (Fairclough, 2010; Van Leeuwen, 2008; Van Leeuwen, 2007) e da Sociologia da Saúde (Biehl, 2012; Caponi, 2009; Caponi & Brzozowski, 2012; Conrad, 2007; Conrad & Barker, 2014; Martins, Gabe & Williams, 2011; Martinez–Hernaez, 2014; Rose & Abi–Rached, 2014) a fim de descrever como atores sociais diagnosticados com Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) são representados no discurso judicial e discutir implicações sociais e econômicas destes modos de representação na produção de narrativas judiciais que envolvam o TDAH. O corpus desta pesquisa é constituído por seis decisões judiciais produzidas pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) entre os anos de 2015 e 2017, divididas em dois grupos: acórdãos produzidos pelo STJ determinando a aquisição de psicofármacos pelo Estado a fim de tratar pacientes que foram diagnosticados com TDAH; e acórdãos produzidos pelo STJ relacionados a crimes de estupro, que envolvam o diagnóstico de TDAH. A análise dos dados revela a produção de neuronarrativas pelo Superior Tribunal de Justiça. Nestas narrativas, os atores sociais são predominantemente despersonalizados e tratados em termos dos diagnósticos a eles atribuídos, de modo a suprimir outros marcadores identitários. Por sua vez, o TDAH é representado como um transtorno neurobiológico, para o qual o tratamento adequado deve ser indicado por um médico especialista e consiste, de modo geral, na administração do psicofármaco de princípio ativo cloridrato de metilfenidato, conhecido comercialmente como Ritalina. Além disso, a análise dos acórdãos envolvendo crimes de estupro revela que o TDAH tem uma função neuropolítica, ora deslegitimando o discurso da pessoa diagnosticada, ora servindo para manter um adolescente em situação de privação de liberdade. A partir destes dados, argumento pela necessidade de as instituições judiciais seguirem as recomendações publicadas em 2015 pelo Ministério da Saúde para a redução de práticas medicalizantes na saúde mental, envolvendo equipes multidisciplinares de Centros de Atenção Psicossocial nos processos diagnóstico e de legitimação da necessidade de uso de psicofármacos, de modo a descentralizá–los do poder médico e reduzir o diagnóstico/consumo inadequado do medicamento Ritalina no Brasil. Ao fim, apresento uma proposta metodológica para estudos em análise crítica do discurso que envolvam a investigação de discursos sobre saúde mental.