O uso de fertilizantes fosfatados na agricultura é importante devido ao alto requerimento deste
nutriente pelas plantas. Contudo, grande parte do fósforo (P) adicionado na forma de fertilizantes
solúveis no solo é rapidamente adsorvido aos óxidos de ferro, alumínio e cálcio, o que pode levar a
uma complexação de 80 % do P aplicado no solo. Superfosfato triplo (SPT) é uma excelente fonte
de P solúvel. Porém, devido ao elevado custo de produção desta fonte, o uso de fosfato de rocha
(FR) tem sido uma alternativa atrativa nos países em desenvolvimento. Mas, a baixa reatividade dos
FR tem estimulado pesquisas envolvendo a utilização de microrganismos solubilizadores de P para
melhorar a disponibilização deste nutriente nos solos adubados com FR. Muitas vezes, esses
microrganismos além de promoverem a solubilização de P, desempenham várias funções que
auxiliam no crescimento vegetal, constituindo candidatos ideais ao desenvolvimento de inoculantes
que aumentem a produtividade e sustentabilidade de culturas agrícolas importantes, como o milho.
Neste trabalho, nós comparamos o efeito da fertilização com FR e SFT, por um período de três
anos, na diversidade da comunidade microbiana da rizosfera do milho utilizando método
independente de cultivo. Além disso, obtivemos isolados bacterianos da rizosfera do milho
cultivado com o FR e sem adição de P, que foram avaliados juntamente com endofíticos também
isolados de milho quanto à solubilização dos fosfatos de rocha (Araxá) e fosfato de ferro em testes
in vitro, promoção do crescimento de milheto cultivado com FR em testes de casa de vegetação, e
ainda quanto à presença de genes relacionados a promoção do crescimento vegetal por análise
genômica. Analisamos também o genoma draft de duas linhagens de Serratia marcescens,
SmCNPMS2112 e SmUFMG85, endofíticas isoladas do milho que se destacaram nos ensaios in
vitro e de casa de vegetação. Esses genomas foram comparados entre eles e com outras linhagens de
Serratia isoladas de diferentes ambientes, visando a identificação de genes relacionados ao estilo de
vida endofítico, promoção do crescimento de planta e patogenicidade. Nos estudos de diversidade
da microbiota da rizosfera do milho, o filo Proteobacteria foi dominante em todas as condições de
fertilização fosfatada, enquanto Oxalobacteraceae (principalmente Massilia sp. e Herbaspirillum
sp.) foi enriquecida no solo adicionado de FR. Klebsiella sp. foi o segundo táxon mais abundante no
solo tratado com FR. Burkholderia sp. e Bacillus sp. foram também enriquecidos no solo fertilizado
com FR, quando comparado ao solo tratado com SPT. Quanto aos fungos, Glomeromycota
apresentou maior abundância nos solos adicionados de FR, os principais gêneros foram
Scutellospora sp. e Racocetra sp.. Estes táxons já são descritos como importantes para a
solubilização / aquisição de P em solo fertilizado com FR. As plantas de milho cultivadas nos solos
tratados com SPT equa com FR apresentaram produtividade similar, e uma correlação positiva foi
detectada entre o conteúdo de P e o perfil da comunidade microbiana desses solos. Bactérias
pertencentes à família Enterobacteriaceae foram predominantes nas culturas obtidas do solo
rizosférico do milho cultivado com e sem adição de FR; os gêneros principais foram Klebsiella e
Enterobacter. Nos ensaios de caracterização dos isolados quanto ao potencial de solubilização de
fosfatos, o fosfato de Araxá foi mais solubilizado do que o fosfato de ferro e as bactérias endofíticas
foram as mais eficiente no processo de solubilização de P à partir do fosfato de Araxá em relação às
rizosféricas. Nos ensaios de promoção de crescimento do milheto, oito das nove bactérias avaliadas
contribuíram para a melhoria de no mínimo um dos parâmetros de crescimento desta planta, com
destaque para os isolados Bacillus megaterium UFMG50, Ochrobactrum sp. CNPMS2088 e S.
marcescens CNPMS2112. Essas bactérias apresentaram genes relacionados ao metabolismo de P,
produção de ácidos orgânicos e de fitohormônios. De acordo com a análise filogenética do genoma
total e dos genes conservados pelas Serratia sp., observou-se que a região conservada contribuiu
mais para a separação dos genomas, enquanto a região acessória não afetou o agrupamento
filogenético dos genomas avaliados. Numerosas funções preditas foram compartilhadas entre as
Serratia sp. de diferentes estilos de vida, como solubilização, hidrólise e aquisição de fosfato,
aquisição de ferro, produção de ácido indol acético (AIA motilidade, adesão e formação de
biofilme, produção de bacteriocina, antibióticos e genes que conferem resistência a drogas e a
agentes oxidantes, além de muitos fatores de virulência. Portanto, as diferenças que definem um
determinado estilo de vida entre as Serratia sp. avaliados são provavelmente mais relacionados às
variações na expressão gênica do que ao conteúdo genômico per se. Além disso, 3 profagos foram
detectados no genoma de S. marcescens SmUFMG85 e 2 no genoma de S. marcescens
SmCNPMS2112. A análise comparativa, juntamente com a busca de ilhas genômicas, mostrou que
as regiões únicas e acessórias estão localizadas em ilhas genômicas. No genoma de
SmCNPMS2112, elas continham, por exemplo, genes do sistema secretor de tipo III, protease,
quitinase, fimbria, sideróforo e β-lactamase. Enquanto em SmUFMG85, estavam presentes genes
do sistema de secreção tipo IV, genes relacionados à conjugação e transposição, quimiotaxia,
aquisição de ferro e produção de ramnolipídeos. Os dados sugerem que o repertório de genes
detectados confirma o estilo endofítico dos isolados SmUFMG85 e SmCNPMS2112 e o potencial
para promover o crescimento das plantas. Além disso, foi evidente o papel do mobiloma de
SmUFMG85 e SmCNPMS2112, especialmente os localizados em ilhas genômicas, para a aquisição
de várias funções que podem conferir capacidade de adaptação à planta hospedeira além de outros
ambientes. As mudanças na composição da comunidade microbiana associada ao tipo de
fertilização fosfatada verificadas neste estudo, embora não seja possível estabelecer relações de
causalidade, apresentaram alguns táxons candidatos que poderiam estar envolvidos na solubilização
do fosfato de Araxá e na promoção do crescimento das plantas. Da mesma forma, os teste feitos in
vitro e em casa de vegetação apontam diversas bactérias como candidatas ao desenvolvimento de
bioinoculantes para a agricultura, as quais precisam ser validadas em experimento em condições de
campo.