O presente estudo teve como objetivos avaliar a presença de sintomas respiratórios e o comportamento da função pulmonar dos trabalhadores que atuam na produção de carvão vegetal, no intervalo entre os anos de 2008 a 2016; analisar a presença de possíveis alterações pulmonares através da tomografia computadorizada de tórax e descrever a prevalência de doenças pulmonares das vias aéreas inferiores e superiores. Também foi objeto deste estudo verificar a concentração de material particulado (MP10) na atmosfera próxima das carvoarias e correlacionar com variáveis meteorológicas. O método do estudo caracterizou-se por uma comparação entre dois estudos transversais, desenvolvidos nos anos de 2008 e 2016, para função pulmonar e sintomas respiratórios. As variáveis relacionadas à ocorrência de doenças pulmonares, às alterações tomográficas, às medidas de volumes pulmonares, à difusão de monóxido de carbono e ao nível de material particulado foram obtidas apenas na avaliação mais recente. A coleta de dados foi realizada em três fases. A fase um, no ano de 2016, consistiu em retornar a todas as 41 propriedades visitadas no ano de 2008. Os carvoeiros foram reavaliados através da função pulmonar e entrevista sobre sintomas respiratórios, semelhantes a 2008. A fase dois consistiu em avaliar as medidas dos volumes pulmonares e da difusão de monóxido de carbono, no laboratório da Universidade Feevale, e na tomografia de tórax, realizada no Serviço de Radiologia do Hospital Regina, em Novo Hamburgo. A fase três consistiu no monitoramento do material particulado e na obtenção das variáveis meteorológicas em trinta coletas de 24 horas cada, durante o ano de 2017. Dos 67 carvoeiros avaliados no estudo de 2008, 4 (5,8%) indivíduos foram a óbito e uma pessoa (1,5%) não foi localizada. Do total de 62 (92,5%) que foram encontrados no ano de 2016, a maioria aceitou participar desta nova etapa da pesquisa. Desta forma, 51 indivíduos participaram da fase um e 42 carvoeiros participaram da fase dois do estudo. Dos 51 carvoeiros avaliados, 38 (74,5%) do sexo masculino, 35 (64,6%) continuavam ativos na produção do carvão vegetal e 16 (35,4%) saíram da atividade. Os carvoeiros apresentaram significativamente mais espirros após 8 anos de exposição por avaliação clínica. A avaliação da função pulmonar dos 51 trabalhadores reavaliados demonstrou um declínio médio e significativo da Capacidade Vital Forçada (CVF) de 48 ml/ano e do Volume Expiratório Forçado no primeiro segundo (VEF1) de 37 ml/ano antes da utilização do broncodilatador (BD). Considerando os valores após o uso do BD, também se observou queda significativa da média da CVF de 51 ml/ano e do VEF1 de 38 ml/ano. Quando consideramos os carvoeiros não tabagistas, o declínio médio, após uso do BD, da CVF foi de 43 ml/ano e VEF1 foi de 34 ml/ano. Já os carvoeiros que eram tabagistas apresentaram diminuição significativa, pós BD, da CVF de 72 ml/ano e para o VEF1 de 50 ml/ano. Do total de carvoeiros, 14 (27%) eram tabagistas, e a diminuição da função pulmonar foi mais acentuada neste grupo, porém, essa diminuição não apresentou diferença significativa comparada aos carvoeiros não tabagistas. Os indivíduos que realizaram as medidas dos volumes pulmonares e da difusão de monóxido de carbono ficaram dentro dos limites da normalidade. Dos 42 carvoeiros que realizaram a tomografia de tórax, apenas 5 (11,9%) apresentaram exames dentro da normalidade, sendo que a maioria, 32 (76,1%), foi diagnosticada com espessamento difuso de paredes brônquicas por broncopatia. Do total de 51 carvoeiros reavaliados, a ocorrência da rinite ocupacional foi de 26,4%, a doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) foi de 18,9% e outras doenças pulmonares como asma brônquica, bronquite crônica, bronquiolite respiratória e bronquiectasias apresentaram percentuais de ocorrência mais baixos. Para qualidade do ar, a média encontrada nos três municípios foi de MP10 24±14 μg/m3 e a temperatura apresentou fraca correlação com o nível de MP10, o que não foi encontrado para as outras variáveis meteorológicas e MP10. Concluindo, mesmo que os três municípios tenham apresentado níveis de MP10 nos patamares de normalidade, com poucas variações acima da média, a atividade carvoeira acarretou em redução dos fluxos e volumes pulmonares no decorrer de 8 anos, principalmente, naqueles que eram tabagistas. Embora não se tenha observado modificações significativas nos sintomas respiratórios, a maioria dos trabalhadores já apresentava espessamento de paredes brônquicas observado na tomografia computadorizada de tórax. Estratégias para estimular o uso de equipamentos de proteção individual, a supressão do tabagismo e um maior controle ambiental nestas áreas seriam de extrema importância no sentido de minimizar os danos respiratórios ocasionados por esta atividade.