Uma vez que a teoria lacaniana defende o inconsciente estruturado como linguagem, podemos dizer que a literatura é um processo inconsciente e consciente de nossas experiências. Quer dizer, ela é resultante de experiências existenciais, sociais e culturais; logo, um “fenômeno da linguagem”. A partir deste pensamento, nos propomos, neste trabalho, a analisar as personagens dos livros Harry Potter e o enigma do Príncipe (2005) e Harry Potter e as Relíquias da Morte (2007), de J. K. Rowling, identificando os desempenhadores da função paterna, e Relacionandoos à personagem Harry Potter, de modo a descrever como se constitui a sua personalidade. Dessa maneira, buscamos estabelecer uma interação entre as ações dessas personagens com a teoria freudiana do complexo de Édipo, principalmente, considerando a premissa lacaniana do conceito de grande Outro, bem como essas funções paternas influenciam a personagem Harry Potter pela castração, permitindo-nos verificar como ele termina por negociar essas relações com o ambiente. Além das teorias de Sigmund Freud (1990, 2010, 2011, 2013, 2014, 2015, 2016) e de Jacques Lacan (1985, 1986, 1988, 1998, 1999, 2003, 2005, 2008), buscamos o apoio de seus sucessores: Dor (1989, 1991, 1995), Elia (2004), Girard (2009) e Safatle (2009), que nos subsidiaram a respeito do complexo de Édipo, estádio do espelho, conceito de sujeito e, especialmente, sobre a figura do pai na psicanálise. Já outros estudiosos, como Bettelheim (2015), Brait (2006), Candido (2011), Coelho (1987, 2000), Corso e Corso (2006, 2016), Hunt (2010) e Marini (1997), foram selecionados para dar subsídios acerca da relação entre literatura e crítica psicanalítica, auxiliar no estudo de personagens, além de proporcionar um entendimento melhor na relação da série Harry Potter com a psicanálise e a contribuição desse para a literatura infanto-juvenil. Realizada a nossa pesquisa, que pode ser classificada como sendo descritivo-interpretativa, concluímos que a psicanálise é um elemento importante para o trabalho com a literatura infanto-juvenil, pois através dos elementos simbólicos e seus significados, constatamos como a figura do pai não mais se apresenta como tradicionalmente conhecemos, em que há uma admiração perceptível. A personalidade heroica, e final, da personagem se faz pelo conjunto de diferentes relações, fruto de identificações ora desejadas, ora contraditórias, baseadas na admiração, na individualidade, nas ações primitivas e sentimento de amizade, como também pela inveja, o ciúme, o desejo de poder e de amor. Porém, tudo coopera com o meio, porque a formação de nossa identidade é justamente o resultado dos elementos biológicos com o ambiente que interagimos desde o nascimento; então, é a partir do como Harry abstrai suas figuras paternas e leva para a vida como experiência, negando parte desse lar paterno, que ele se assume verdadeiramente significante de seu ambiente enquanto herói.