O presente estudo busca apresentar os resultados de uma análise de impacto
ambiental ampla, utilizando indicadores ambientais relacionados ao setor
agroindustriais no sul do Brasil. O produto agrícola alvo do estudo é o tabaco
(Nicotiana tabacum L.), carro chefe da economia regional, com histórica inserção na
matriz econômica e produtiva, gerador de benefício e renda para mais de 600.000
pequenos produtores rurais nos três estados sulistas (RS, SC e PR). Enquanto dados
econômicos e agronômicos relacionados ao tabaco estão disponíveis no Brasil e em
vários outros países produtores, a questão ambiental relacionada a produção agrícola
e o beneficiamento industrial da matéria prima não foram abordados
consistentemente. O escopo do estudo considerou todos os processos do ciclo de
vida do tabaco desde a sua etapa produtiva agrícola inicial até o término do
beneficiamento industrial da matéria prima, sendo o mesmo definido como do berço
ao portão (cradle to gate). A clara definição do escopo na avaliação ambiental foi
importante para mensurar impactos ambientais potenciais e na identificação de hot
spots ambientais. Também serviu para guiar os esforços do setor produtivo na
melhora da performance ambiental dos dois principais tipos de tabacos brasileiros-
Virgínia (VA) e Burley (BU). Foram levados em consideração a realidade produtiva
das pequenas propriedades agrícolas, consumo de substancial volume de biomassa
florestal na cura & secagem, uso de fertilizantes e defensivos agrícolas, a logística de
assistência técnica aos produtores, transporte da matéria prima e beneficiamento
industrial em moderna unidade processadora. O trabalho comparou os dois tipos de
tabaco e seus impactos ambientais mensurados. A) tabaco VA, fertilização
balanceada, colheita em folhas e curado e seco em estufas, com temperatura e
umidade controlados. Tabaco BU: recebe maior dosagem de fertilizantes, colheita em
corte de plantas e cura e secagem em galpões, com temperatura e umidade ambiente.
Os impactos destes dois tipos de tabaco foram relacionados através dos seguintes
estágios de produção: produção de mudas (canteiros), lavoura (tratos culturais), cura
& secagem e beneficiamento industrial (processamento). Para analisar os dados
relativos à produção agrícola, foi estabelecida parceria com uma empresa fumageira,
para a obtenção do banco de dados necessários ao estudo. Planilha de dados foram
elaboradas e coletadas informações de 14.409 produtores rurais e de uma unidade
industrial localizada no vale do Rio Pardo- RS, que serviram de base para a
elaboração do inventário do ciclo de vida. Neste contexto o estudo utilizou a
ferramenta da análise do ciclo de vida (ACV) na determinação de cinco categorias de
impactos ambientais para cada tipo de tabaco: i) pegada de carbono, ii) potencial de
acidificação terrestre (PAT), iii) potencial de toxicidade humana (PTH), iv) potencial de
eutrofização aquática (PUA), v) potencial de depleção de água (PDA). O estudo foi
desenvolvido em linha com as normas ISO 14040 e ISO 14044, através do software
Umberto NXT LCA 7.13, e do banco de dados Ecoinvent 3.2. Os impactos ambientais
foram avaliados pelo método ReCiPe midpoint, com exceção da pegada de carbono,
que utilizou o método IPCC 2013. Os resultados dos impactos ambientais foram
ajustados para a unidade funcional de uma tonelada de tabaco beneficiado. Um
estudo diagnóstico foi desenvolvido que analisou o consumo de biomassa na cura e
secagem e o inventário reflorestamento nas regiões produtoras, possibilitando
assumir que o inventario florestal estimado nos fumicultores atende a critérios de
autossuficiência energética nas regiões de produtoras. A análise resultante dos
impactos ambientais alcançados entre os dois tipos de tabacos trouxe a luz a
diferenciação nos resultados alcançados em cada categoria de impacto e revelou as
duas principais etapas produtivas que mais contribuíram para os resultados
alcançados: (i) a queima de biomassa florestal no Tabaco VA, e (ii) nas maiores
dosagens de fertilizante nitrogenado no tabaco BU. Para o tabaco VA, a combustão
de biomassa florestal foi determinante nos resultados da pegada de carbono,
acidificação terrestre e toxicidade humana. A pegada de carbono do tabaco VA foi
35,5% maior que o BU, sendo 2.205,38 kg CO2-eq e 1.623,34 kg CO2-eq
respectivamente. O potencial de acidificação terrestre no tabaco VA foi 28,8% maior
que o BU, com resultados de 13,27 kg SO2-eq e 10,32kg SO2-eq. O potencial de
toxicidade humana no tabaco VA alcançou índice de 617% superior ao tabaco BU,
com 2.198,34 kg 1,4 DCB-eq no primeiro e 306,45 kg 1,4 DCB-eq no segundo. Estas
três categorias de impactos foram diretamente impactadas, mas não exclusivamente,
devido a combustão da biomassa florestal nas estufas e fornalhas industriais
associadas as emissões de GEE, material particulado, metais pesados e outros
compostos. Para o tabaco BU, uso de maiores dosagens de fertilizantes e o processo
de manufatura dos fertilizantes foram determinantes, mas não exclusivas, nos
resultados no potencial de eutrofização aquática e potencial de depleção de água. O
potencial de eutrofização aquática no tabaco BU foi 14,5% maior que o VA, sendo de
18,51 kg P -eq e 16,17kg P-eq respectivamente. O potencial de depleção de água no
tabaco BU foi 61,4% maior que o VA, sendo de 36,04 m3 e o 22,33 m3
respectivamente, associados ao arraste de P e N das lavouras para os corpos hídricos
e o processo de manufatura de fertilizantes. A análise dos impactos ambientais
resultantes possibilitou a identificação de sete atividades com elevado potencial de
impacto ambiental, ou hot spots ambientais. Medidas mitigadoras dos impactos
ambientais foram propostas, oferecendo maior assertividade nas eventuais
intervenções na melhora da performance ambiental. Pela análise conjunta dos
resultados, a conclusão é de que as melhores opções para a melhora da performance
ambiental do sistema brasileiro seria prover modificações relacionadas ao processo
de manufatura de fertilizantes, através do decréscimo de consumo de energia através
da sua melhoria energética ou substituição do consumo de combustíveis fosseis por
fontes de energia renováveis, substituição de tipos de formulações e eventuais ajustes
de dosagem. O outro fator é na melhoria da combustão da biomassa florestal nas
fornalhas, melhorando a eficiências energética e reduzindo a combustão incompleta.
A expansão de áreas com cultivo mínimo e plantio direto também podem contribuir
para a melhorada performance ambiental. A interação com a empresa local e a
elaboração do inventário do ciclo de vida robusto possibilitou a determinação de uma
avaliação do ciclo de vida representativo do setor fumageiros no sul do Brasil. O
estudo atendeu aos objetivos gerais e específicos propostos e teve como mérito
apresentar de forma inovadora a realização de um compreensivo estudo ambiental
utilizando a ferramenta de Avaliação de Ciclo de Vida e preencher uma lacuna nas
avaliaçoes ambientais deste importante cultura agrícola para a economia e o meio
ambiente da região. O estudo também possibilitou o avanço da base de conhecimento
da avaliação ambiental do tabaco, podendo servir de linha de base de monitoramentos
da performanace ambientais e referência para futuros estudos correlacionados.