No Nordeste do Brasil, a porção de Mata Atlântica ao norte do rio São Francisco, conhecida como Centro de Endemismo de Pernambuco (CEPE) por ser um hotspot de biodiversidade, é a região mais impactada e fragmentada do bioma. A fauna de mamíferos de médio porte é pouco conhecida nessa região, a despeito do seu papel ecológico como espécies-chave na estruturação das comunidades biológicas, especialmente na ausência de grandes predadores. Com os processos de antropização e a expansão de áreas urbanizadas próximas aos ambientes naturais, ocorre o aumento da população de mamíferos domésticos, cães e gatos, que acabam afetando diretamente os mamíferos silvestres por competição, predação ou transmissão de parasitos. Este trabalho objetivou analisar a estrutura das comunidades de mamíferos de médio porte por meio da composição de espécies, riqueza e diversidade, em três Unidades de Conservação de Mata Atlântica no estado da Paraíba. Ainda, avaliamos a presença de cães domésticos como espécie invasora, estimando sua abundância, densidade, padrão de uso do espaço e período de atividade. O estudo foi realizado na Reserva Biológica Guaribas e duas Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPN) Fazenda Pacatuba e Engenho Gargaú. Para tanto, utilizamos armadilhas fotográficas espalhadas em grids com intervalo
de 1km2. Obtivemos 642 registros de mamíferos silvestres pertencentes à 14 espécies e 86 registros de cães e gatos domésticos. A ordem mais representativa foi a Carnivora, e as espécies mais frequentes foram Dasyprocta iacki (n= 255; 35%), Didelphis albiventris (n= 184; 25%) e Dasypus novemcinctus (n=60; 8%). Destacamos a presença de Leopardus pardalis, sendo estes os primeiros registros do animal na área de estudo. Destacamos ainda o registro de Cabassous tatouay, devido ao seu baixo número de registros para a região, possuindo apenas dois espécimes na Coleção de Mamíferos da Universidade Federal da Paraíba, Coendou prehensilis, por ser uma espécie com hábitos e habitat arborícola, bem como os primatas Alouatta belzebul e Sapajus flavius, que estão criticamente ameaçados de extinção. A riqueza de mamíferos silvestres representou a metade do pool de espécies regional, podendo isso estar relacionado a elevada fragmentação e perda de habitat da área, como também pode estar ligada a práticas de caça que ocorrem na região, resultando em processo de defaunação. A alta frequência de
D. albiventris, pode ser um indicativo de áreas perturbadas, bem como a ausência de espécies de carnívoros esperadas para região podem gerar um efeito cascata nas comunidades biológicas. Em relação aos cães domésticos, foram estimadas a abundância e a densidade na Rebio Guaribas SEMA II (n = 90; 3,2 cães/km²) e na RPPN Fazenda
Pacatuba (n=29, 6,2 cães/km²), respectivamente. O horário de atividade dos cães nas UCs teve picos entre 1:00-3:00AM e 5:00-07:00AM, e o padrão de uso foi mais frequente nas bordas na RPPN Faz. Pacatuba, e na Rebio Guaribas, tanto na borda como em suas estradas internas. Os registros de cães domésticos nas UCs são relevantes para a criação de estratégias visando impedir a presença desses animais nas áreas estudadas, tendo em vista que são considerados como espécie invasora que pode trazer efeitos negativos para a fauna local. Ações envolvendo as comunidades do entorno das áreas para o esclarecimento dos problemas de saúde que a interação entre cães e mamíferos silvestres podem causar, como também a realização de censos da população canina concomitantes com estudos epidemiológicos e campanhas de vacinação e castração nos cães das comunidades dos entornos das áreas também devem ser realizadas.