A costa amazônica é impactada por uma intensa influência da maré, que em associação a
baixo relevo, faz com que o rio Amazonas e alguns de seus grandes tributários, sejam
enquadrados na categoria de tidal river. Os efeitos combinados da geometria, das marés,
e da extensa rede de drenagem resultam em uma sedimentação maciça na região. Nesse
contexto, este trabalho apresenta o primeiro estudo detalhado da variação de maré, da
sedimentologia e morfologia do fundo do Rio Tapajós, buscando compreender o papel da
morfologia e das marés nos padrões de distribuição e dinâmica de sedimentos na área.
Os principais dados utilizados na elaboração do presente trabalho, foram coletados em
duas campanhas amostrais, durante os períodos de baixa e alta descarga, com
levantamentos de dados de nível d’água, vazão durante ciclos semi-diurnos (13 horas) e
amostragem de sedimentos de fundo. As medições do nível d’água no curso inferior do
Tapajós indicam que a incursão da maré oceânica poderia atingir até 320 km a montante
da confluência da Amazonas-Tapajós durante períodos de baixa descarga, quando as
maiores variações no nível da água foram registradas. Assim, as marés semi-diurnas se
propagam e causam variação de nível d’água ao longo do Tapajós por até 1.100 km da
foz do rio Amazonas, o que pode representar a maior incursão das marés no mundo.
Apesar, do efeito da maré na área não resultar em reversão do fluxo, seu efeito sobre as
medições de vazão instantânea, foram notórios, chegando a mostrar até um período
estofo de maré durante a fase de enchente. Em outras palavras, o fluxo instantâneo caiu
para níveis próximos de zero a maré de enchente e a descarga durante a maré de
vazante alcançou valores de 12.500 m3/s durante o período de descarga baixa e 18,000
m3/s durante o período de alta descarga, na estação 30km próxima a confluência com o
Amazonas. Durante alta descarga, apenas pequenas variações do fluxo foram
observadas na seção transversal superior, e estas não foram necessariamente
associadas à maré. As variações das marés não só influenciam fortemente os processos
hidrodinâmicos, como também afetam o transporte de sedimentos em suspensão. Com
relação à distribuição dos sedimentos de fundo no baixo Tapajós, destaca-se o fato de se
assemelhar a um embaiamento estuarino típico, marcando uma morfologia peculiar e
complexa. As análises revelaram que a morfologia e a hidrodinâmica resultam em uma
armadilha de sedimentos perfeita, pois a energia de entrada de materiais no Tapajós,
oriundo da bacia do Tapajós a montante e do Amazonas na desembocadura, é mais alta
que a energia de saída, incapaz de redisponibilizar os sedimentos para o canal principal
do Amazonas. Os padrões de distribuição mostram sedimentação massiva de lama no
lago/ria, enquanto o setor entrelaçado (braided-straight) do rio Tapajós transporta
sedimentos finos, mas principalmente areias, construindo um delta na extremidade a
montante da ria, no setor de transição. Na confluência (foz), os diques do rio Amazonas
bloqueiam o Tapajós, e as variações do nível da água em função das marés, também
favorecendo o transporte de sedimentos lamosos do rio Amazonas para a Ria do Tapajós.
No entanto, a ação das ondas na Ria cria setores em constante erosão, com
características semelhantes às de praia nas margens, fato que torna ainda mais atípico e
diverso os tidal rivers e a dinâmica de sedimentos da Amazônia.