O presente trabalho propõe uma análise comparativa entre o livro Feliz Ano Novo (1975), de Rubem Fonseca, e o filme Taxi Driver (1976), de Martin Scorsese, verificando como ocorrem os processos de (des)subjetivação dos personagens protagonistas de ambas as obras. Compreendendo as subjetividades como fluidas, construídas na e pela linguagem, elegemos a construção das masculinidades e a expressão da violência como objetos de análise, interligados nestas narrativas. Focamo-nos, para tanto, na leitura de cenas enunciativas presentes na obra de
Fonseca e de Scorsese, em que as relações de intersubjetividade são colocadas em evidência e as conexões entre poder e discurso são desnudadas em suas mais diversas formas e possibilidades expressivas. Para embasar teoricamente a nossa pesquisa, recorremos a três eixos basilares: os estudos de gênero, especificamente aqueles voltados à construção das masculinidades, a teoria da enunciação de Benveniste e as abordagens interdisciplinares sobre violência. A partir deste referencial teórico, empreendemos uma leitura em que a trajetória errante de Travis Bickle, protagonista do filme de Scorsese, conduz a análise da contística fonsequiana. Assim, à medida que acompanhamos os desdobramentos analíticos referentes à construção da subjetividade masculina de Travis e sua inserção no mundo da violência, vamos verificando as convergências e distanciamentos de sua caracterização daquela dos personagens masculinos de alguns contos de Feliz Ano Novo. Acreditamos que o principal ponto de conexão
entre o livro de Fonseca e o filme de Scorsese se dê pela forma como ambos os textos operacionalizam as relações de poder que alicerçam a construção das masculinidades e, por conseguinte, a instituição e crise do domínio androcêntrico. Desenvolvemos, na tentativa de investigar esse processo, um modelo triangular de análise das relações entre as pessoas daenunciação, que dialoga com aquele proposto por Benveniste, mas, de certa forma, o subverte no quesito da inversão da escala hierárquica ocupada pelo objeto do discurso. Nesse ínterim, a
projeção do eu a partir do desejo de ser/ter o outro – objeto de fetiche – ajuda-nos a compreender a forma como a masculinidade se constrói gravitacionalmente à violência nas obras em análise.