A vaccínia bovina (VB) é uma zoonose causada pelo Vaccinia virus (VACV) que afeta principalmente vacas leiteiras e humanos. Estudos prévios têm detectado partículas virais viáveis de VACV em amostras de leite de vacas natural e experimentalmente infectadas. Porém, ainda não se sabe se o leite contaminado pode transmitir VACV após o consumo. Por outro lado, há um estudo que mostra que humanos, inclusive crianças, que vivem em áreas endêmicas de VB, mas que nunca tiveram contato com vacas doentes, apresentaram anticorpos anti-OPXV, sugerindo que o VACV pode ser transmitido por outras vias. Levando em consideração o previamente exposto, esta tese teve como objetivo estudar a transmissão de VACV pelo leite em modelo murino e a detecção e viabilidade de poxvirus no queijo e leite. No capítulo 1, 30 camundongos receberam 100 µl de leite, por via oral, contendo 106 UFP de VACV-GP2. Amostras de suabe oral (SO), fezes, tecidos e sangue foram coletadas e analisadas. Nenhuma alteração clínica foi observada nos camundongos. DNA viral foi detectado, de forma intermitente, nas amostras de SO e de tecidos a partir do 2º d.p.i., enquanto em amostras de sangue e fezes a partir do 5º d.p.i. A detecção ocorreu até o 10ºd.p.i. em SOs e, nas demais amostras, até o 30º d.p.i. Em todos os tecidos dos animais infectados, exceto coração, tonsila, língua, estômago and duodeno, foram observados imunomarcação intracitoplasmática na técnica de IHQ em todos os tempos analisados. Anticorpos neutralizantes (AN) foram detectados no 20º e no 30º d.p.i. em 50% dos camundongos infectados. No capítulo 2, 12 L de leite foram contaminados com 105 UFP/ml de VACV-GP2 e seis queijos foram produzidos. Os queijos foram submetidos ao processo de maturação durante 1, 7, 14, 21, 45 e 60 dias a 25ºC. As amostras de queijo foram quantificadas na qPCR e tituladas em células VERO. A quantificação e a titulação viral apresentaram redução no decorrer do tempo de maturação, porém, não apresentaram diferença estatística. O 3º capítulo refere-se à detecção de VACV em amostras de queijos de campo provenientes de propriedades com e sem surto de VB. Cinquenta e nove queijos frescos e maturados foram coletados e analisados, sendo que dez queijos foram produzidos em propriedades com casos de VB e 49, oriundos de fazendas sem histórico da doença. A técnica de PCR-nested foi utilizada na detecção de DNA viral. As amostras de queijo positivas na PCR-nested foram inoculadas em cultivo celular ou membrana corioalantóide de ovos embrionados (MCA) de galinha. A confirmação do efeito citopático (ECP) foi realizadapelas técnicas de imunoperoxidase em monocamada celular (IPMC) e qPCR, respectivamente. O DNA viral foi detectado em 43 das 59 amostras testadas. Destas, 11 tinham partículas infecciosas do VACV, sendo quatro amostras oriundas de propriedades sem casos de VB. No último capítulo, seis propriedades leiteiras em Minas Gerais, com surtos de doenças vesiculares acometendo vacas em lactação, bezerros e humanos, foram visitadas. Aleatoriamente, foram selecionadas, por propriedade, dez vacas com lesões e amostras de leite foram coletadas, totalizando 60 amostras de leite. Além disso, duas crostas das lesões nos tetos das vacas também foram coletadas em cada fazenda, totalizando 12 crostas. Das seis propriedades estudadas, em todas foi confirmada a presença de OPXV nas amostras de crosta. A existência de coinfecção de PPV e de OPXV foi confirmada em quatro delas. Como duas propriedades foram negativas para PPV, as amostras de leite, provenientes das vacas destas propriedades, não foram analisadas. Com relação aos leites testados, foi observada amplificação para o gene B2L em 12 amostras das 40 analisadas, indicando a presença de PPV em 30% dos leites testados. Destas 12, oito estavam contaminadas tanto com PPV quanto com OPXV. Os resultados mostraram que leite contaminado pode ser fonte de infecçãode VACV em modelo murino, sendo que os animais apresentaram infecção subclínica com distribuição sistêmica e eliminação pelas fezes e mucosa oral. Além disso, o processo de maturação do queijo reduz o número de partículas virais viáveis, mas não foi capaz de inativar o vírus durante os 60 dias testados. Por outro lado, a detecção de VACV em amostras de queijos Minas artesanais mostrou que o VACV pode circular de forma silenciosa, uma vez que houve detecção em amostras de queijos de propriedades sem surto de VB. Além disso, foi possível detectar coinfecção de PPV e VACV em amostras de leite de propriedades com surto de doenças vesiculares. Desta forma, o consumo de leite e queijos contaminados com VACV pode ser um risco para a saúde pública. Porém, mais estudos são necessários para determinar o possível risco de transmissão do vírus para humanos associado ao consumo de leite e queijos artesanais contaminados com VACV.