Diversas linguagens artísticas se desenvolveram no período colonial brasileiro e, entre elas, ainda se encontram preservados numerosos exemplares remanescentes da tradicional técnica da escultura aplicada à construção de imagens religiosas. Destinadas a espaços religiosos ou civis, a produção tridimensional de caráter escultórico abrangeu desde a elaboração de elementos ornamentais até a realização de figuras de santos (imagens sacras).
Imbuído dos rígidos princípios da Contrarreforma, o culto aos santos se tornou um poderoso instrumento evangelizador e catequético, sendo difundido a partir do século XVI, pela atividade das ordens religiosas no Brasil, que em muito favoreceram a popularização das imagens de culto que, inicialmente importadas de Portugal e posteriormente, também produzidas na própria colônia. Essas imagens ocupariam os tronos nos nichos dos retábulos de altares das igrejas, capelas, oratórios domésticos e, nos dias de festa, sairiam às ruas em procissões. É importante destacar quão fundamental foi a contribuição das ordens terceiras e irmandades para a difusão e consolidação deste vasto trabalho, desenvolvido entre as comunidades locais.
A partir do século XIX, mudanças de ordem política, econômica e social, favoreceram a entrada de novos padrões estéticos vindos da Europa, fazendo com que muitas igrejas optassem por realizar reformas, chegando a substituir os exemplares executados em barro ou em madeira, por novas peças, agora executadas em série, conduzindo à perda de muitos dos antigos originais. No entanto, embora pouco estudado, um significativo número de obras executadas segundo as técnicas tradicionais, ainda permanece guardado em templos católicos do Estado de São Paulo, seja na capital, no interior, ou no litoral.
O presente trabalho, por meio do levantamento de uma representativa parte desse acervo, estuda a imaginária religiosa remanescente do período colonial, com ênfase para a produção erudita de uso retabular. A análise do repertório iconográfico desse conjunto conduz à verificação da presença de devoções que se tornaram populares nessas terras, o que ao lado de elementos técnicos e formais pode contribuir não apenas para o conhecimento a respeito da arte, mas de diversos aspectos da sociedade paulista durante o período colonial brasileiro.