Na última década, o tema da governança da terra tem preenchido um espaço cada vez maior nas agendas de instituições públicas e privadas, que se ocupam do desenvolvimento, sobretudo, de zonas rurais. O Brasil pode ser considerado um país no qual os desafios da governança da terra se expressam de formas variadas e complexas. Pois, apesar de sua histórica vocação agroexportadora, a grande maioria da população rural composta por agricultores familiares e assalariados rurais, responsáveis pela segurança alimentar e abastecimento interno do país, têm sofrido com a concentração fundiária, dificuldades no acesso à terra, insegurança na posse e limitações em exercer o poder sobre o seu território (especialmente no caso de populações tradicionais). Neste sentido, o objetivo desta dissertação é analisar as políticas de crédito fundiário e sua capacidade de melhorar as estruturas de governança da terra, no que se refere, a sua intervenção na estrutura fundiária, no processo de gestão descentralizado, participação da heterogeneidade de atores envolvidos e sua possibilidade de impulsionar a (re)territorialização da agricultura familiar. Foram adotados como instrumentos metodológicos: pesquisa documental e estudos de caso. A pesquisa bibliográfica e documental permitiu construir um quadro interpretativo para compreender a governança da terra como uma dimensão da governança territorial. No que se refere ao acesso à terra, foi realizado um levantamento sobre o tema no contexto brasileiro, com olhar para o seu processo sócio-histórico e as diferentes normativas instituídas sobre a questão, desde o período colonial, além de um levantamento das atuais políticas, com enfoque na reforma agrária e crédito fundiário. A pesquisa documental foi utilizada para reunir elementos relativos às trajetórias dos programas de crédito fundiário, o ambiente institucional e político que foram constituídos. Foi empreendido, também, um levantamento sobre a experiência francesa de reordenamento da estrutura agrária ? Sociedades de Ordenamento Fundiário e de Estabelecimentos Rural (SAFER) ? com o propósito de demonstrar os resultados da criação de instrumentos para regulação dos mercados fundiários, baseados em um sistema de governança construído pelo Estado e as organizações de profissionais agrícolas. Os estudos de caso serviram de base para analisar experiências de implementação da política de crédito fundiário e sua atuação no contexto local. Para tanto, duas pesquisas de campo foram efetuadas. A primeira foi em três projetos do Programa Nacional de Crédito Fundiário (PNCF) da linha deCombate a Pobreza Rural (CPR), no Estado do Piauí, e a segunda em quatro propriedades da linha de Consolidação da Agricultura Familiar (CAF), em Santa Catarina. Os resultados da pesquisa demonstraram que o crédito fundiário pode ser um instrumento de ordenamento fundiário, primordial para a governança da terra, nas seguintes questões: ampliação das áreas insuficientes à reprodução familiar (reestruturação dos minifúndios ou fusão de parcelas); aproveitamento de áreas inexploradas ou semi-exploradas; possibilidade para impedir maior concentração fundiária; instrumento para reaproveitar terras com usos inadequados e/ou subutilizadas; impulsionar processos de (re)territorialização da agricultura familiar.