O desenvolvimento infantil é o resultado da interação de fatores biológicos,
psicológicos e sociais. Ambiente hostil, renda, estímulos oferecidos, bem como a
presença de uma doença crônica são questões que podem interferir significativamente.
Considerando as doenças crônicas, podemos identificar a cardiopatia congênita (CC)
que se caracteriza por malformações cardíacas anatômicas e funcionas e atualmente tem
apresentado uma incidência de até 1% na população de nascidos vivos. Esta pesquisa
teve como objetivo avaliar o desenvolvimento infantil e verificar uma associação com o
comprometimento por fatores biopsicossociais de crianças com e sem CC. Fizeram
parte do estudo crianças de zero a seis anos, divididas em três grupos: Grupo1- 29
crianças cardiopatas congênitas pré-cirúrgicas, Grupo2- 43 crianças cardiopatas póscirúrgicas e Grupo3- 56 crianças saudáveis. Os instrumentos utilizados foram um
questionário biopsicossocial e o Teste de Triagem de Denver II. Do total de 128
crianças avaliadas, 66 (51,56%) são meninas, sendo que a idade variou dos dois meses
aos seis anos (mediana 24,5 meses). No G1 e G2 houve predomínio de cardiopatias
acianóticas (55,2% e 58,1%). Em relação as avaliações do Denver II, as crianças
cardiopatas tiveram mais classificações de desenvolvimento “suspeito” e
“suspeito/anormal”, sendo que 41,9% das crianças que já passaram por procedimento
cirúrgico tiveram seu desenvolvimento caracterizado como “suspeito/anormal”. No
grupo das crianças saudáveis 53,6% foram classificadas com perfil desenvolvimental
“normal” (p=˂0,0001). Sobre os domínios do Denver II, entre as crianças cardiopatas
houve maior alteração nas áreas motoras (p= 0,016, p=˂0,001). As variáveis
biopsicossociais que se mostraram relacionadas a um possível atraso no
desenvolvimento foram: sexo (p=0,042), idade da criança (p=0,0001) e renda per capita
(p=0,019). Não foram encontradas associações entre as variáveis relacionadas ao
tratamento da cardiopatia, informação, compreensão da doença e do modo como os pais
tratam os filhos. Já no grupo das crianças saudáveis evidenciou-se que crianças que
passaram por internação hospitalar tiveram mais índices de alterações no
desenvolvimento (p=0,025) e quanto maior o número de internações mais essas
alterações se intensificaram (p=0,023). Os resultados sugerem que crianças com
cardiopatia congênita tenham provável atraso no desenvolvimento. Também foi
possível verificar que existe uma diferença significativa entre as crianças que passaram
por procedimento cirúrgico, daquelas que ainda aguardam cirurgia fazendo somente
acompanhamento clínico. As alterações de o desenvolvimento estarem mais ligadas as
áreas motoras podem ser explicadas por aspectos característicos da doença e do
tratamento, como dispneia, cansaço, cuidados e limitações nas atividades diárias. As
variáveis sexo e idade parecem ser determinantes no desenvolvimento, bem como,
crianças saudáveis passarem por experiência de hospitalização. Já nas crianças
cardiopatas, se percebeu que as variáveis sociais que envolvem a doença e o tratamento
não comprometeram o desenvolvimento. Essa questão pode ser entendida por meio de
fatores protetores e de resiliência, já que essa população recebe apoio familiar e social.