A síntese microbiana de polissacarídeos tem emergido como uma fonte relevante de novos biopolímeros para aplicação industrial. Dentre eles destaca-se a curdulana, um hidrocolóide com característica única de geleificação. A curdulana é um exopolissacarídeo neutro formado exclusivamente por mais de 12000 unidades de glicose unidas por ligações do tipo -1,3, com um peso molecular médio de 74000 Da. Ele é produzido comercialmente pela bactéria Agrobacterium sp biovar 1. Sua suspensão em água pode formar dois tipos de géis distintos pelo ajuste da temperatura: um gel fraco obtido com aquecimento a 60 °C e posterior resfriamento, termo-reversível, e um gel forte obtido com temperaturas superiores a 80 °C, termo-irreversível. Géis com forças diferentes são formados pela variação da temperatura, tempo de aquecimento, e concentração de curdulana. Além disso, os géis podem ser formados em uma ampla faixa de pH, na presença de açucares, amidos, sais, gorduras e óleos. As propriedades particulares da curdulana atendem as necessidades da indústria de alimentos, onde ela é utilizada como geleificante, estabilizante, para melhorar a viscosidade, a textura e a estabilidade dos alimentos. Na maioria dos alimentos ela é utilizada na forma de gel irreversível sendo estável durante processos de destilação, frituras intensas e ciclos de congelamento e descongelamento. Esse biopolímero também apresenta um elevado potencial de aplicação na indústria farmacêutica devido às potentes atividades biológicas que exerce, além de ser considerado fibra dietética, com possível atividade prebiótica. A sua versatilidade em combinação com seus benefícios para a saúde é certamente uma ferramenta de valor para o desenvolvimento de novos produtos. Estudos tem sido conduzidos para otimizar a produção de curdulana e atender a grande demanda em suas aplicações. A imobilização de microrganismos constitui uma alternativa a ser explorada, e uma matriz de imobilização, que constitui um foco de interesse, é a esponja vegetal. A qual está disponível em abundância, apresenta baixo custo, técnica de simples aplicação, alta estabilidade durante o uso repetido, é porosa e resistente a autoclavagem, a variações de pH e de temperatura. A aplicação de ciclos sucessivos com células imobilizadas permite a recuperação e reutilização de células adaptadas, resultando em uma produção com alto rendimento e produtividade. Dentro desse contexto, o estudo da interação de microrganismos com a matriz de imobilização é necessário, e a aplicação da técnica espectroscopia de infravermelho por transformada de Fourier no modo de refletância total atenuada (FTIR-ATR) pode ser utilizada para essa finalidade, pois permite a avaliação da estrutura físico-química de materiais, por meio da detecção de bandas de absorção de grupos químicos moleculares e da ocorrência de modificações. Conforme o presente conhecimento dos autores desse estudo, a literatura não apresenta dados sobre a imobilização de células bacterianas para a produção de curdulana. Então, o objetivo do presente trabalho foi avaliar a produção de curdulana por Agrobacterium sp. IFO 13140 imobilizado em espoja vegetal, alginato, e combinação de esponja vegetal com alginato. E, posteriormente, com o uso da matriz de imobilização que apresentou a melhor performance, otimizar a imobilização e a produção de curdulana, avaliar a produção em ciclos operacionais consecutivos, e analisar a interação das células com a matriz e o seu efeito sobre a mesma por meio da técnica FTIR-ATR. Sendo o controle representado pela aplicação de células livres para a produção de curdulana. Primeiramente foi avaliada a imobilização do microrganismo em diferentes matrizes: espoja vegetal, alginato, e combinação de esponja vegetal com alginato. A curdulana produzida foi quantificada e a imobilização foi analisada por meio da técnica de microscopia eletrônica de varredura. Como não houve diferença significativa na produção de curdulana, e a imobilização foi detectada em todas as matrizes estudadas, a esponja vegetal foi escolhida como matriz por possibilitar aplicação prática e econômica, e alta estabilidade mediante uso contínuo. A imobilização do microrganismo em esponja vegetal foi otimizada por meio da avaliação da combinação das variáveis tempo de incubação, biomassa inicial e velocidade de agitação. Após a determinação das melhores condições para a imobilização celular, foi avaliada a produção de curdulana sob diferentes velocidades de agitação do meio de produção. Um estudo cinético da produção de curdulana foi, então, conduzido, e determinados o consumo de glicose e nitrogênio, e a produção de curdulana e biomassa, ao longo de 14 dias. Células imobilizadas foram submetidas a ciclos consecutivos de produção com duração de 10 dias cada ciclo. Ao final de cada ciclo as esponjas foram transferidas para um novo meio de produção, e determinada a biomassa presente no meio, e ao final do primeiro ciclo foi determinada a biomassa imobilizada na esponja vegetal. A estabilidade de armazenamento de células imobilizadas e estocadas a 4 °C e liofilizadas e estocadas a -18 °C foi determinada no decorrer de 300 dias. Para caracterizar a interação do Agrobacterium sp. IFO 13140 com as fibras da esponja vegetal, e sua influência na estrutura desta matriz, foi utilizada a técnica FTIR-ATR. Ao término do primeiro, terceiro e quinto ciclo de produção de curdulana, três esponjas com e sem a presença do microrganismo, foram submetidas à análise. Foram também analisadas as amostras de esponja vegetal, meio de pré-inóculo, meio de produção, e esponja vegetal com o meio de pré-inóculo. A curdulana produzida nos ensaios foi quantificada e caracterizada por FTIR e FTIR-ATR, e sua pureza determinada. Os resultados foram comparados com àqueles obtidos para a curdulana comercial. A curdulana foi aplicada em iogurte produzido com cultura mista de Streptococcus thermophilus e Lactobacillus delbrueckii subsp. Bulgaricus. A acidez e o pH do produto foram determinados no decorrer de 28 dias de armazenamento a 4 C, e comparados com os resultados obtidos para o iogurte controle, sem a presença de curdulana em sua formulação. Amostras com e sem adição de curdulana foram preparadas e estocadas por 1 dia a 4 C, e, posteriormente, submetidas à análise sensorial. A análise foi feita por 120 provadores não treinados, e uma escala hedônica de 9 pontos foi utilizada para avaliar a aceitabilidade dos produtos quanto a textura, ao sabor, a cor e a acidez. A intenção de compra também foi determinada. A microscopia eletrônica de varredura mostrou um grande número de células de Agrobacterium sp. IFO 13140 aderidos à superfície das fibras da esponja vegetal. A esponja vegetal é constituída por um sistema vascular de fibras dispostas de forma multidirecional, sendo que suas interconexões formam uma estrutura aberta. Dessa forma, o microrganismo pôde manter o seu metabolismo e consequente produção de curdulana. As melhores condições para a imobilização foram 50 mg de célula, 200 rpm e 72 h de incubação. E as células imobilizadas apresentaram maior produção de curdulana em relação às células livres, 19,45 g.L-1 e 14,50 g.L-1, respectivamente. Mudanças no microambiente proporcionado pela matriz foram benéficas e convenientes para a imobilização celular e a produção de curdulana. Para cada quantidade de célula utilizada e para cada tempo de imobilização avaliado, a produção de curdulana foi maior com o aumento da velocidade de agitação. Isso pode ser um sinal de transferência de massa, aliado ao aumento da oxigenação. O modelo de regressão utilizado para analisar os resultados ajustou-se adequadamente aos dados experimentais, com um R2ADJ de 0,82, estatisticamente significativo. E de acordo com a equação obtida foi observada uma interação sinérgica entre os fatores avaliados, demonstrando que a análise isolada de cada variável não seria apropriada. O processo de imobilização aumentou significativamente a produção de curdulana em 17,27%. A incubação a 72 h resultou num aumento de 7,92% na produção, comparado com 48 h. A manutenção da velocidade de agitação em 200 rpm proporcionou um aumento de 3,65% na produção. A produção de curdulana sob diferentes velocidades de agitação do meio de produção foi maior a 150 rpm, quando comparada com a produção obtida a 110 e 200 rpm, e por células livres. O controle da agitação é um fator importante, pois interfere no fornecimento de oxigênio para o aumento da biomassa, e pode também conduzir a formação de um ambiente estressante para o microrganismo. Quanto ao estudo cinético da produção de curdulana por células imobilizadas e livres, a produção por células imobilizadas iniciou 34 horas antes daquela observada para células livres. Aos dez dias de incubação foram detectadas a exaustão da glicose e a produção máxima de curdulana. A estabilidade operacional foi avaliada, e até o quarto ciclo as células imobilizadas mantiveram 87,40% da produção obtida no primeiro ciclo (20,62 g.L-1). A maior produtividade volumétrica foi alcançada pelas células imobilizadas no primeiro ciclo, e foi de 0.09 g.L-1.h-1, enquanto para células livres foi de 0.06 g.L-1.h-1. A velocidade específica de produção foi de 0,37 e 0,03 g curdulana.g-1células.h-1 para células imobilizadas e livres, respectivamente. A maior produção de curdulana por células imobilizadas foi devida a melhor atividade biocatalística proporcionada pelo sistema. As células imobilizadas demonstraram elevada estabilidade operacional, foi verificada a viabilidade e a atividade metabólica celular após 300 dias de estocagem a 4 °C e a -18 °C. A presença do microrganismo aderido à esponja vegetal ficou evidenciada pela alteração no espectro obtido por FTIR-ATR para a esponja vegetal com células imobilizadas presente no meio de produção em relação ao espectro obtido na ausência de células. Essa alteração foi representada pela banda de transmitância em 1080 cm-1, verificada em todos os ciclos produtivos, a qual sugere a presença de curdulana na esponja vegetal. Isto evidencia a possibilidade da curdulana ter sido produzida também para aderência celular à matriz de imobilização. Os resultados obtidos não mostraram modificações nas fibras da esponja vegetal no decorrer de cinco ciclos produtivos. A curdulana produzida por Agrobacterium sp. IFO 13140 apresentou a mesma estrutura química da curdulana comercial, não houve diferença nos espectros obtidos para ambas as moléculas. A pureza foi de 87,41 e 91,28%, respectivamente. O uso de curdulana em iogurte resultou em um produto funcional mais estável com menor pós-acidificação e sinerese quando comparado com o iogurte controle. Além disso, o produto não diferiu estatisticamente do iogurte controle quanto às características sensoriais, o que permitiria a sua comercialização sem afetar a sua aceitabilidade pelos consumidores. Os resultados do presente estudo demonstraram sucesso na imobilização de Agrobacterium sp. IFO 13140 para a produção de curdulana, um processo inovativo, com potencial para futura aplicação em escala industrial.