O teste de susceptibilidade à optoquina (Opt) é um dos principais utilizados para a identificação convencional de Streptococcus pneumoniae, um importante agente de infecções invasivas em seres humanos e que se diferencia de espécies alfa-hemolíticas relacionadas, tais como Streptococcus mitis e Streptococcus pseudopneumoniae, por ser considerado universalmente sensível a Opt. Contudo, alguns estudos relatam a ocorrência de cepas atípicas resistentes à Opt (Opt-R) em diversas regiões do mundo, o que pode levar a um diagnóstico laboratorial impreciso. Este fenótipo tem sido atribuído a mutações pontuais nos genes que codificam para as subunidades c ou a da F0F1ATPase bacteriana, que é o alvo molecular da Opt. No presente trabalho, foram analisadas 34 amostras clínicas de S. pneumoniae Opt-R, além de cepas de referência de S. pneumoniae, S. mitis e S. pseudopneumoniae, utilizando diversas técnicas de caracterização fenotípica (teste de bile-solubilidade, aglutinação em látex, reação de Quellung, teste de susceptibilidade a antimicrobianos, determinação da concentração mínima inibitória de Opt e MALDI-TOF MS) e genética (detecção de genes associados à virulência, determinação dos tipos capsulares, PFGE, MLSA, MLST, MLVA, análise do polimorfismo de genes pspA e sequenciamento dos genes atpC e atpA seguido da predição do modelo das proteínas codificadas). Entre as cepas atípicas de pneumococos foram observados dois fenótipos Opt-R: heterogêneo (22 amostras), caracterizado pela presença de subpopulações sensíveis e resistentes à Opt em uma mesma amostra; e homogêneo (12 amostras), caracterizado pela resistência uniforme à Opt. O teste de bile-solubilidade, PCR para o gene lytA e MLSA apresentaram-se como boas opções para identificar e diferenciar amostras atípicas de S. pneumoniae dos outros estreptococos relacionados. Já a reação de aglutinação em látex, PCR para o gene ply e MALDI-TOF MS mostraram baixo poder discriminatório entre essas espécies. Uma alta diversidade de perfis fenotípicos e genéticos foi observada entre as amostras Opt-R, sendo as subpopulações sensível e resistente derivadas de amostras heterogêneas consideradas idênticas entre si em todas as técnicas utilizadas, exceto pela CMI de Opt (4 a 64X maiores) e pela presença de mutações nos genes atpC ou atpA nas subpopulações Opt-R. Vinte e nove amostras apresentaram mutações pontuais na subunidade c, com destaque para o códon 49 (alterado em 14 amostras), e 5 na subunidade a (todas no códon 206). Cinco tipos de mutações observadas não haviam sido anteriormente descritas na literatura (Met13Ile, Gly18Ser, Gly20Ala, Ala31Val e Ala49Gly). Todas as amostras Opt-R geraram modelos preditivos para as subunidades c e a compatíveis com o esperado e idênticos àqueles gerados com as sequencias das cepas de referência de todas as espécies avaliadas, sugerindo que essas subunidades, apesar de diferenças na sequência de aminoácidos, são funcionais e conservadas entre os estreptococos quanto a estrutura tridimensional. Os resultados corroboram com informações da literatura que apontam que Opt-R não está relacionada à disseminação clonal, mas sim a mutações nos genes que codificam para subunidades da ATPase bacteriana, e contribui com novas informações sobre a diversidade de mutações associadas à Opt-R e sobre as possíveis consequências dessas alterações em modelos preditivos dessas subunidades.
Palavras- chave: Streptococcus pneumoniae. Resistência à optoquina. ATPase. Gene atpC, Ggene atpA. Mutações pontuais.