Idades de soterramento de grãos de quartzo pelos isótopos cosmogênicos 26Al e 10Be foram obtidas
em depósitos sedimentares que assorearam os sistemas de cavernas associados aos vales cegos dos
riachos das Almas e Água de Rega, região de Iraquara (BA). Os resultados também incluem a
caracterização faciológica e uma abordagem preliminar sobre a arquitetura dos depósitos, além do
mapeamento em campo do contexto geomórfico dos sistemas de condutos e seu preenchimento
sedimentar. Coberturas terciárias assentadas sobre todas as unidades pré-cambrianas testemunham
que a superfície cárstica e os sistemas de condutos fazem parte de uma longa história de evolução,
envolvendo episódios de exposição, soterramento e exumação. Durante os dois últimos milhões de
anos, a drenagem superficial e os sistemas de cavernas estavam plenamente articulados na condução
de água e sedimentos, com rotas de fluxo subterrâneas que incluíam ainda trechos labirínticos préexistentes,
que serviam de repositório de sedimentos durante os eventos de inundação,
proporcionando também, rotas alternativas ao canal, na medida em que o sistema agradava. A
sucessiva migração do canal por estas redes labirínticas originou o padrão distributário observado
na Lapa Doce e na Gruta da Torrinha. Os depósitos sedimentares estudados nas cavernas dividemse
em dois grupos: fluviais e de água estagnada. Os depósitos fluviais ocorrem na base e são
constituídos por fácies de canal e fácies de inundação. As idades de soterramento de grãos de
quartzo destes sedimentos apontam para um período de assoreamento fluvial compreendido entre
1,91±0,12 e 0,36±0,08 milhões de anos para o sistema Lapa Doce-Torrinha (riacho Água de Rega) e
1,37±0,15 e 0,87±0,17 milhões de anos para o sistema Cão-Talhão (riacho das Almas). No sistema
Lapa Doce-Torrinha as idades de soterramento concentram-se no intervalo compreendido por dois
períodos úmidos (350-450 Ka e 900-1000 Ka), registrados em estudos anteriores através do
crescimento de tufas calcárias no semiárido baiano. Tal fato sugere que a agradação fluvial
verificada, tanto nos rios quanto nas cavernas, esteja associada a fatores climáticos, particularmente
o aumento da carga dos rios derivado da diminuição na estabilidade dos grãos nas vertentes
exercida por uma vegetação arbustiva esparsa ou ausente. No topo, os depósitos de água estagnada,
preferencialmente compostos por lamas, não possuem estruturas trativas ou de corrente e são
associados a uma sedimentação em ambiente freático, para o qual é necessário considerar a subida
do nível de base. Gretas de contração, além de relações estratigráficas e erosivas destes depósitos
com crostas calcíticas evidenciam que eles não foram depositados em um evento único. Idades
U/Th obtidas nas crostas calcíticas apontam para uma deposição durante o Pleistoceno Tardio.
Interpreta-se que as lamas foram depositadas durante períodos de elevação do nível de base devido
aos eventos úmidos abruptos de escala milenar que ocorreram no nordeste brasileiro ao longo dos
últimos 210 ka.