Esta tese tem como objetivo principal investigar o papel desencadeado
pelo sotaque na relação entre categorização e discriminação, bem como especificar o
mecanismo psicológico que explica este processo. Para tanto, foram formuladas três
hipóteses principais que norteiam a execução de quatro estudos empíricos. Em um
cenário de tomada de decisão para contratação de um funcionário foram realizados
quatro estudos em Portugal. O sotaque do candidato à vaga foi manipulado, podendo ser
o sotaque português ou o sotaque de imigrante brasileiro. Os participantes eram
solicitados a informar qual candidato deveria ser contratado (medida de discriminação).
O Estudo 1 testou a hipótese de que a influência da categorização de um alvo ativada
pelo seu sotaque (nacional vs. imigrante) na discriminação é moderada pelo
preconceito. Participaram 71 estudantes universitários com idade média de 21,8 anos
(DP = 4,27; 34 homens e 37 mulheres), que foram randomicamente alocados em uma
de duas condições experimentais (sotaque de imigrante brasileiro vs. sotaque
português). Os resultados indicam que a relação entre a categorização pelo sotaque e a
discriminação é moderada pelo preconceito (b = 0,51, t (67) = 2,67, p ˂ 0,05, η
2
p =
0,31), de modo que apenas em participantes preconceituosos a categorização pelo
sotaque leva à discriminação do imigrante brasileiro. O Estudo 2 buscou replicar o
estudo anterior e testar a hipótese de que a relação proposta na hipótese 1 é mediada
pela avaliação do sotaque do candidato, pois a avaliação do sotaque desencadeia um
processo de perceber o sotaque do membro do grupo externo como pior. Contou-se com
a participação de 124 estudantes universitários com idade média de 23,7 anos (DP =
4,83; 60 homens e 64 mulheres), aleatoriamente alocados em uma de duas condições,
sotaque português vs sotaque de imigrante brasileiro. Como previsto, os resultados
indicam que o preconceito modera a influência da categorização pelo sotaque na
discriminação. Ademais, os resultados suportam a mediação da avaliação do sotaque
nesta relação (Z = 2,46, p ˂ 0,05), corroborando a segunda hipótese. O Estudo 3 buscou
replicar o estudo anterior, desta vez com um delineamento dentre participantes, e testar
a hipótese alternativa de que a influência da categorização na discriminação é mediada
pelo uso da informação estereotípica. Contou-se com a participação de 105 estudantes
universitários com idade média de 24,1 anos (DP = 4,37; 48 homens e 47 mulheres).
Como previsto, os resultados indicam que o preconceito modera a influência da
categorização pelo sotaque na discriminação e que apenas a avaliação do sotaque
medeia esta relação (Z = 1,98, p ˂ 0,05). O Estudo 4 buscou testar a hipótese de que a
mediação ocorre porque a avaliação da qualidade do sotaque atua como um fator
legitimador da discriminação. Contou-se com a participação de 39 estudantes
universitários com idade média de 20,5 anos (DP = 3,67; 12 homens e 27 mulheres),
aleatoriamente alocados em uma de duas condições (sem ou com a justificação pelo
sotaque), em um design unifatorial entre participantes. Como previsto, os resultados
indicam que os participantes julgaram como mais legítima a condição em que a
justificação ocorre pelo sotaque (M = 4,30, DP = 1,31) do que a outra condição (M =
3,25, DP = 1,18), t(35) = -2,54, p ˂ 0,05. Neste sentido, os resultados desse estudo
suportam a hipótese de que o sotaque pode ser legítimo como um argumento para
justificar a discriminação. Destarte, as implicações destes resultados devem ser
consideradas como o primeiro passo para analisar o papel do sotaque na discriminação.