O pirarucu (Arapaima gigas) é um peixe exclusivo da Bacia Amazônica e
característico das águas calmas de suas várzeas. Sua carne é considerada de alto valor
comercial, contudo a espécie encontra-se ameaçada de extinção. O risco de extinção aliado às
características zootécnicas peculiares tornam o pirarucu uma espécie de alto potencial para a
aquicultura nacional. O presente trabalho objetivou contribuir com o conhecimento da
fisiologia digestiva do pirarucu e o aproveitamento dos resíduos de seu processamento através
da identificação, caracterização e purificação de proteases presentes no trato digestório deste
peixe. A atividade proteolítica em órgãos digestivos de Arapaima gigas foi quantificada e
caracterizada utilizando substratos e inibidores específicos. A presença de pepsina foi
observada no estômago utilizando hemoglobina a 2% como substrato. Foi observada a
presença deTripsina , quimotripsina e aminopeptidases no ceco do pilórico e intestino, usando
Nα-benzoil-Arg-p-Nan, Succinil-Ala-Ala-Pro-Phe-p-Nan, Leucina-p-Nan e aminoacil β-
nafitilamida como substratos, respectivamente. O ceco pilórico apresentou uma alta atividade
proteolítica quando comparado com o intestino, com exceção das aminopeptidases. Entre as
aminopeptidases avaliadas a arginina e leucina aminopeptidase apresentaram maiores
atividades. As atividades de tripsina (10,1 e 0,53 U.m-1), quimotripsina (0,92 e 0,04 U.m-1) e
de leucina aminopeptidase (0,66 e 0,84 U.m-1) foram determinadas no ceco pilórico e
intestino, respectivamente. O pH e temperatura ótimos também foram determinadas para a
tripsina ( pH 9,0 ; de 65 °C ) , pepsina ( pH 1,5-3,5 , 60 °C ) e quimotripsina ( pH 9,0 , 55 °C )
. Perfis similares para intestino e cecos pilóricos foram observadas através de SDS -PAGE
(bandas em um intervalo de 116-6,8 kDa) e zimograma (oito bandas proteolíticas). Uma
tripsina termoestável de sequência N-terminal IVGGEYCPRNSVPYQVSLNVGYH e massa
molecular 28 kDa (SDS-PAGE) e 23,5 kDa (espectrometria de massa) foi purificada a partir
do ceco pilórico do peixe pirarucu (Arapaima gigas). Suas propriedades físico-químicas e
cinéticas foram caracterizadas utilizando BApNa e z-FR-MCA como substrato. Através do
ensaio com diferentes substratos foram observadas diferenças na atividade enzimática da
enzima purificada. O pH e temperatura ótima encontrados para atividade máxima da tripsina
purificada foram 9,0 (BApNA) e 9,25 (z-FR-MCA), e 65 °C (BApNA) e 45 °C (z-FR-MCA),
respectivamente. Utilizando z-FR-MCA como substrato, a enzima manteve 100 % de sua
atividade inicial após 180 min de incubação a 45 °C, enquanto que foi estável por 30 min de
incubação a 55 °C em ensaios realizados com BApNA. A enzima foi fortemente inibida por
Resumo
xii
PMSF e TLCK em ensaios com ambos substratos. Os valores encontrados para os parâmetros
cinéticos Km, kcat e kcat/Km foram 0,47 ± 0,042 mM, 1,33 s-1 e 2,82 mM-1s-1, respectivamente,
usando BApNA como substrato. Na presença de sais metálicos, os parâmetros cinéticos
realizados com z-FR-MCA apresentaram um aumento de aproximadamente 7 vezes na
eficiência catalítica (kcat/Km) utilizando Ca2+ na concentração final de 0,01 e 0,1M. Duas séries
de peptídeos-FRET (Abz-RXFK-Eddnp e Abz-XRFK-Eddnp) foram utilizados para
determinar a especificidade dos subsítios S1 e S2 da tripsina de A. gigas. A enzima
apresentou uma especificidade maior a substratos contendo Arg, Tyr e Ser na posição P1 e
substrato contendo Lys and Val na posição P2 e uma deficiência catalítica na presença de Pro,
Trp, Asp, Gly, Glu, Ala na posição P1 e Gly, Glu, Trp, Asn, Gln e Tyr na posição P2. Os
resultados produzidos neste trabalho contribuem com informações importantes sobre a
fisiologia digestiva da espécie A. gigas, assim como propõe o uso de suas vísceras para a
obtenção de tripsina com potencial para aplicações biotecnológicas. Além disso os estudos de
caracterização da tripsina do pirarucu contribui com informações importantes para futuros
estudos envolvendo proteases de peixes.