Descrição:
Esta pesquisa está articulada ao grupo de pesquisas Cognições e práticas formativas educacionais em espaços escolares e não escolares (GPCEPE) e incorpora TCCs e dissertações de mestrado em Educação sob orientação do coordenador do projeto. O GPCEPE tem forte vinculação com investigações acerca da abordagem da Corporeidade e, por isso, aprofunda os estudos que relacionam o corpo à educação, especialmente, da região amazônica. Nesta perspectiva, abre um campo de investigação abrangente, em que se possibilita ampliação e reestruturação de conhecimentos, bem como reflexão e compreensão de práticas educativas – entendendo que estas são carregadas de diferentes visões de mundo, valores da sociedade, do ser humano e da educação.
O processo de desenvolvimento do ser humano é possibilitado a partir das relações estabelecidas com os outros, com a natureza e com o mundo. Diante disso, a escola é percebida como espaço apropriado para a formação educacional que busca humanizar a prática pedagógica através da valorização dos conhecimentos relativos ao corpo, à cultura e à história do ser humano. Deste modo, não há como fomentar uma educação escolar relacionada, apenas, à escrita, leitura, noções de matemática, natureza: trata-se de formar educandos para conviverem entre si e em interação com o mundo, com outros seres e com o que os cerca.
Cabe destacar a presença do esporte no contexto escolar, assim como em programas e projetos sociais de iniciativa pública e privada. A atenção nesses casos é concentrada naquilo que ele pode proporcionar, ou seja, a finalidade não está na prática em si, mas nas possibilidades educativas aos praticantes/brincantes. Logo, além da escola, o esporte-educação é disseminado pelas escolinhas desportivas, tanto as de cunho social como as comerciais (COUTO, 2012), e estas conservam, respectivamente, como objetivo central e secundário, a formação humana como aspecto da aprendizagem esportiva. Nesse tipo de prática esportiva a relação com o corpo é caracterizada pelas rotinas exaustivas de treino/trabalho/preparação na qual se desenvolvem não apenas as qualidades e habilidades necessárias ao esporte, mas também e conjuntamente com a técnica, o próprio corpo é forjado – entenda-se o uso da palavra nos diversos sentidos: assim ele é construído, fabricado, elaborado, modelado, adulterado. Portanto, é necessário despertar para o entendimento de que o corpo é condição da existência humana (NÓBREGA, 2010), a forma com a qual se lida com as experiências cotidianas são definidoras do que se é.
A percepção do corpo é um processo de afirmação da personalidade, da individualidade, do sentido de pertencimento à humanidade e dialogar acerca do tema corporeidade implica em compreender que o ser humano é a própria expressão de existência no mundo. Nessa perspectiva, quando o ser humano é consciente do seu papel nas relações que estabelece, passa a favorecer o desenvolvimento de habilidades sociais importantes na construção de relacionamentos saudáveis que valorizam as diferenças sociais, culturais e individuais, proporcionando ao sujeito bem-estar e melhores condições aos processos educativos. O sujeito enquanto ser social precisa construir visão crítica sobre a realidade. Tal visão pode ser favorecida pelas práticas educativas que se estabelecem nas relações sociais nos espaços de educação formais e não-formais/informais. As habilidades sociais têm em seus pressupostos a necessidade do envolvimento nas interações sociais de interdependência, aceitação e solidariedade. O sujeito se desenvolve por meio da condição natural de integrar redes de conexão que visam a organização e orientação entre os grupos, estando próximos ou não, visando a valorização e o respeito mútuo (DEL PRETTE; DEL PRETTE, 2017).
São objetivos desta investigação: 1 Compreender os sentidos que os professores, alunos e demais profissionais da educação atribuem ao corpo e, consequentemente, a manifestação da corporeidade nas práticas pedagógicas em espaços onde se promove a educação formal, em especial, nas escolas da cidade e dos territórios rurais de Santarém – Pará; 2 como os sujeitos, atuando em espaços nos quais a educação não formal e informal é desenvolvida, conferem, especificamente, na relação entre corpo, corporeidade, habilidades sociais em ambientes esportivos.
Justifica esse proposta investigativa a percepção de que é na perspectiva de uma educação que liberta o corpo ao invés de dominá-lo, que transcende o pensamento dicotômico de corpo-alma, que percebe o ser humano em sua complexidade que se torna importante compreender a corporeidade. Para tanto, é necessário quebrar paradigmas culturais e históricos. A corporeidade implica ter a capacidade de olhar o mundo e sentir-se parte dele como corpo vivo, comunicativo em processo constante de aprendizagem. Nesse sentido, o corpo nesse estudo é percebido como aquele que se movimenta pelo tempo e espaço através de gestos, expressões, vozes, pensamentos, anseios, conhecimentos, sorrisos, vontades, sonhos, capaz de sentir dor, alegria, tristeza, carinho e afeto, tudo ao mesmo tempo. “O conceito de corpo ativo [...] é o da corporeidade vivida, em que o ser pensa o mundo, o outro e a si mesmo na tentativa de conceber essas relações, na tentativa de reaprender a ver a vida e o mundo. O corpo ativo, que é vida, busca ver os seres que se mostram, pois estes estão escondidos uns atrás dos outros ou atrás de mim” (MOREIRA et al. 2006, p. 139). O corpo ativo se remete à tentativa de estabelecer relações com os outros, com os objetos e com o mundo, na perspectiva de uma aprendizagem significativa, pois “educar-se é aprender a fazer história, fazendo cultura” (MOREIRA et al., 2006, p. 140). A corporeidade, portanto, é a que parte da visão do corpo sujeito, sendo um corpo protagonista de vivências, que busca uma educação pautada na produção do conhecimento, contrariamente à visão de corpo-objeto, que parte para um olhar racional, que compara o ser humano a um corpo mecânico, estático, fragmentado, dócil, manipulado pelos interesses do poder, pela educação, pela mídia e pela ciência (MOREIRA, 1995a).
A partir desse viés, a corporeidade cumpre papel significante na formação humana, fazendo-se busca por conhecer, perceber, viver e interpretar a existência; ela sustenta o caráter do movimento com originalidade, ímpar em sua manifestação, desvinculando a ideia da repetição de movimento como reprodutor de ações de corpo mecanizado, mas como ação cultural e histórica de um corpo que comunga sua relação com o mundo, com o outro e consigo. Os movimentos do corpo do ser humano trazem a união entre sensibilidade e inteligibilidade movida por intenções; tal união comunica-se com outros corpos e com o meio, buscando significados e sentidos na perspectiva da auto-superação (COUTO, 2008). Dessa forma, a corporeidade recebe influências do meio, provenientes dos conhecimentos produzidos, das vivências culturais e sociais, do contato com os outros indivíduos, das informações recebidas no decorrer da vida, das práticas educacionais vigentes, das singularidades e diversidades da cultura, crença e história da humanidade. A partir disso, entende-se a educação como “experiência profundamente humana” (MOREIRA ET AL., 2006, p. 140). A corporeidade e as habilidades sociais tem como pressuposto desenvolver no sujeito a consciência de si enquanto ser atuante, crítico, reflexivo, conhecedor de suas expressões, para, com isso, desenvolver formas de transcender as opressões. Nos estudos das habilidades sociais, evidencia-se a importância do autoconhecimento, de estar em contínua monitoria dos pensamentos, sentimentos e comportamentos na interação com o outro e com o ambiente, pois, para que se desenvolvam formas saudáveis de relacionamentos, é necessário que o sujeito tenha conexão com o que se passa com e dentro de si (DEL PRETTE; DEL PRETTE, 2017). Merleau-Ponty (1999, p. 95) reflete que “tenho consciência de meu corpo através do mundo [...] e tenho consciência do mundo devido a meu corpo”.
Nesse sentido, a educação na perspectiva da humanização ancora-se em princípios de igualdade e em valores éticos de uma sociedade que devem ser desenvolvidos na ação cotidiana, não apenas dos espaços formais de educação, mas também daqueles não formais e informais, considerando especialmente os ambientes esportivos.
Este estudo desenvolve-se numa linha metodológica de caráter descritivo e de campo, com abordagem qualitativa. Observa Britto (2008) que qualquer projeto de investigação de conhecimentos que envolva uma população determinada deve ter abrangência, instrumento e aplicações bem estabelecidos. O desenvolvimento da pesquisa, bem como a legitimidade de seus achados, depende, assim, do tipo de instrumento e das características da amostra. Como instrumento metodológico será utilizada a “Técnica de Elaboração e Análise de Unidades de Significado”, desenvolvida por Moreira, Simões, Porto (2005). Essa técnica parte da combinação das abordagens de Análise de Conteúdo, em especial uma adaptação da Análise de Avaliação Assertativa (BARDIN, 1977), e da Análise do Fenômeno Situado (GIORGI, 1978 e MARTINS E BICUDO, 1989). Daí a importância do trabalho de revisão bibliográfica e do estabelecimento de um referencial teórico consistente, capaz de iluminar os eventuais achados. Logo, compreende-se que só é possível entender qualquer processo se se compreende sua história. Em outras palavras, há que se buscar a base de sustentação dos processos para que se possam entender suas bases dinâmico-causais.